Novo líder do DEM na Câmara diz que pedirá a prefeito de São Paulo que não deixe o partido. Deputado baiano venceu disputa interna contra grupo liderado pelo paulistano, que flerta com o PMDB
ACM Neto derrotou candidato apoiado por Bornhausen (à esquerda) na disputa pela liderança do DEM |
O novo líder do DEM na Câmara, deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (BA), diz que pedirá pessoalmente ao prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), que não deixe o partido. ACM Neto faz parte da ala liderada pelo presidente nacional do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), que disputa o poder interno com a ala de Kassab, que tem o ex-presidente do partido Jorge Bornhausen (SC) como uma de suas principais referências.
“Se depender de mim, vai ficar. Vou trabalhar pra isso. Vou visitá-lo em São Paulo e pedir a ele que fique. Vou criar as condições que estiverem ao meu alcance para a permanência do prefeito. É um quadro importante, e nós desejamos que ele continue na nossa legenda”, diz o deputado, de 32 anos.
ACM Neto foi conduzido à liderança após derrotar o paranaense Eduardo Sciarra, apoiado por Kassab e Bornhausen, por 27 votos a 16. Dentro do partido, há quem veja na nova vitória da ala de Rodrigo Maia um impulso a mais para a saída do prefeito paulistano.
Depois de ter seu pior desempenho nas eleições para deputado e senador desde a redemocratização, o DEM (antigo PFL) tenta manter o prefeito da maior cidade do país e seus dois governadores – Rosalba Ciarlini (RN) e Raimundo Colombo (SC) - para sobreviver politicamente. Em dezembro de 2009, o partido perdeu de maneira traumática o governo do Distrito Federal, o único que tinha na época, com o escândalo do mensalão de José Roberto Arruda (saiba tudo sobre o assunto).
Kassab e Colombo estão cada vez mais pertos do PMDB, e a sina do governo único pode se repetir para o segundo maior partido de oposição do país. Desde 1999, quando o PFL elegeu 106 deputados, a quantidade das cadeiras ocupadas pelo partido só vem caindo. A legenda tem apenas 43 representantes na Câmara e cinco no Senado. Por causa da perda de votos na Câmara, o DEM corre risco de perder R$ 6 milhões do Fundo Partidário este ano.
O grupo de ACM Neto é aliado do senador Aécio Neves (PSDB-MG), enquanto o de Kassab e Bornhausen é ligado ao ex-governador de São Paulo José Serra (PSDB), candidato derrotado por Dilma Rousseff (PT) na disputa presidencial.
O novo líder diz que a divisão interna é passageira. “Tudo isso é momentâneo, circunstancial, e pode mudar”, relativizou o deputado, neto do senador Antônio Carlos Magalhães (DEM-BA), morto em julho de 2007. “Estamos firmes no propósito de reorganizar o partido e dar as condições para que ele possa se fortalecer”, acrescentou.
Confira na íntegra da entrevista de ACM Neto:
Congresso em Foco – O senhor vai exercer pela segunda vez não consecutiva a liderança do DEM. Quais serão seus principais desafios?
ACM Neto - Temos grandes desafios não apenas na atuação parlamentar, mas também na estruturação partidária. Estamos firmes no propósito de reorganizar o partido e dar as condições para que ele possa se fortalecer.
A que o senhor atribui o racha atual no partido?
São coisas normais. Todos os partidos têm suas divisões, algumas ficam mais nos bastidores, outras vão mais a público. Nós estamos há oito anos na oposição, e estamos partindo para o terceiro período consecutivo na oposição. Isso foi uma opção que o partido fez por opção ideológica, por respeito à vontade das urnas. Isso tem preço. O preço de perder quadros, de não fazer governadores. Agora, tudo isso é momentâneo, circunstancial, e pode mudar. Então, quem tem espírito partidário, quem tem desejo de seguir à frente neste partido, vai saber encontrar o caminho da unidade. E é isso o que eu procurarei fazer.
Depois da queda de Arruda, o único governador do partido na gestão passada, o DEM conseguiu eleger dois governadores em outubro – mas um deles ameaça ir para o PMDB. O DEM ainda não se recuperou do “mensalão do Arruda”? Como é chegar à liderança nesse cenário?
O DEM saiu mais forte das urnas. O presidente Lula apregoou a extinção do partido, e isso não ocorreu. O partido não tinha nenhum governador quando entrou nas eleições de 2010, e saiu com dois. Então, acho que o partido tem o seu caminho de reconstrução, de fortalecimento, e nós vamos marchar nessa direção.
Há também a ameaça de desfiliação do prefeito Kassab. O senhor acredita que ele vai ficar ou sair no DEM?
Se depender de mim, vai ficar. Vou trabalhar pra isso. Vou visitá-lo em São Paulo e pedir a ele que fique. Vou criar as condições que estiverem ao meu alcance para a permanência do prefeito. É um quadro importante, e nós desejamos que ele continue na nossa legenda.
O partido é criticado por não trabalhar um nome próprio para a Presidência da República. Como o senhor responde àqueles que dizem que o partido está acomodado na condição de coadjuvante do PSDB?
Nós tivemos [candidato próprio] no passado. Primeiro, na figura de Luiz Eduardo Magalhães, que estava sendo preparado para ser candidato à Presidência da República e, infelizmente, aos 43 anos de idade, Deus o levou. Depois, houve a candidatura de Roseana Sarney, que foi vítima de um escândalo público [menção ao caso Lunus, empresa do ex-marido de Roseana, em São Luís, onde a Polícia Federal encontrou R$ 1,3 milhão em dinheiro não declarado, em plena disputa presidencial de 2002. Roseana era a candidata do então PFL]. Acabou não dando certo. Depois, de lá pra cá, realmente não houve um quadro nacional que tivesse condições de disputar a eleição para presidente. Esse pode ser um caminho, mas não o único. O ideal é que consigamos, a médio e longo prazo, projetar essa preparação de um quadro para a disputa presidencial. Mas isso não impede que a gente tenha parceiros e dialogue com outros partidos para compor projetos e construir caminhos.
Que balanço o senhor faz de sua passagem pela Corregedoria da Câmara?
Com muita tranqüilidade, fiz um balanço de quantos processos eu peguei desde que cheguei à Corregedoria, de quantos estou deixando [para o próximo corregedor]. Agora, há uma incompreensão sobre o procedimento legal. Não cabe à Corregedoria punir, e sim encaminhar ao Conselho de Ética, e ela encaminhou. Quem não puniu foi o Conselho de Ética. É um erro gravíssimo, o Conselho de Ética precisa ser completamente repensado nessa Casa. Eu tenho, inclusive, um projeto que está pronto, e a qualquer instante pode ser pautado, de reforma completa do colegiado. Por quê? Porque a Corregedoria processou e mandou deputados para o Conselho. Agora, o Conselho é que pune, e não puniu.
O Conselho de Ética acaba alimentando a má imagem que já tem junto à sociedade?
Não vamos exagerar. Acho que existem casos e casos. Eu diria que a maioria dos deputados brasileiros é de pessoas sérias e honradas. Agora, tem alguns que não são, e esses têm de ser punidos.
De um lado, com combatividade, fiscalizando o governo, cobrando as ações do Poder Executivo, que é o meu papel. Agora, por outro lado, também sabendo negociar, dialogar, conversar. E construir uma agenda para o país, que é o que eu pretendo.
Fonte: Congressoemfoco