terça-feira, dezembro 14, 2010

MP denúnciou prejuízo só em um mês do contrato

O que levou o Tribunal de Justiça de São Paulo a rever a condenação de Paulo Maluf no caso frangogate, um dos mais emblemáticos que passou nos últimos anos pela Justiça paulista? O ponto determinante foi que a corte paulista entendeu que não houve prejuízo ao erário público com a operação triangular, envolvendo a prefeitura paulistana e as empresas Ad’Oro e Obelisco.

Ao falar de prejuizo para os cofres públicos na compra de frango para a merenda escolar do muncípio, o Ministério Público só levou em conta um mês do contrato. Ao analisar o contrato inteiro, o TJ-SP constatou que o município, na verdade, economizou R$ 200 mil.

Maluf foi acusado de compra superfaturada de frangos durante sua gestão à frente da prefeitura de São Paulo. "Condenar o Paulo Maluf é mais difícil do que escalar o monte Everest", disse um promotor de Justiça que atua na área de defesa do patrimônio público. A Procuradoria de Justiça disse que está analisando a decisão de hoje para saber se vai ou não recorrer aos Tribunais Superiores.

O Tribunal paulista concluiu que, ao contrário do que sustentava o Ministério Público, considerado o valor total do contrato, o município economizou no lugar de sofrer prejuízo ao contratar a Ad’Oro.

"A grande variação do mercado de commodities e o fato de a empresa ter praticado valor fixo fazem com que em certos meses haja vantagem ao erário e em outros não", afirmou o relator do recurso, desembargador Nogueira Diefenthäler. O relator entendeu que é impositivo considerar o valor global do contrato e não aquele praticado em único mês.

O Ministério Público acusou Paulo Maluf, Marcelo Pereira Daura e Francisco Nieto Martins, além das empresas Obelisco Agropecuária e Empreendimentos e Ad’Oro, da prática de atos de improbidade administrativa, configurados na forma de fraude à licitação. O objetivo da alegada fraude era favorecer empresas vinculadas à familiares do então prefeito paulistano.

O Ministério Público Estadual pediu a devolução do dinheiro aos cofres públicos ao acusar superfaturamento na compra de 1,4 tonelada de frango. O valor da suposta ilicitude era apontado em R$ 1,39 milhão. Os frangos eram comprados da empresa de Sílvia e Lígia Maluf, mulher e filha do ex-prefeito. O contrato da empresa Ad’Oro com a prefeitura vigorou de julho de 1996 a abril de 1997.

A ação foi julgada improcedente em primeira instância, em 2002. O juiz Fernando Borba Franco isentou o ex-prefeito de ser obrigado a devolver o prejuízo causado aos cofres públicos. Além do ex-prefeito, foram citados Marcelo Daura, ex-presidente da Comissão de Preços, Francisco Martin, ex-secretário de Abastecimento, e as empresas Obelisco Agropecuária e Empreendimentos e a Ad’Oro, que pertence à mulher e à filha de Maluf.

A operação consistia na venda dos frangos pela Obelisco para a Ad’Oro que os revendia para a prefeitura. Os frangos abasteciam creches e escolas da prefeitura. A Ad’Oro se comprometeu com a prefeitura de cobrar R$ 1,73 pelo quilo do frango congelado.

A pergunta que o Tribunal de Justiça procurou responder no julgamento desta segunda-feira foi se a contratação da Ad’Oro gerou prejuízo para a prefeitura. "A resposta objetiva é não", afirmou o desembargador Nogueira Diefenthäler. Ele reconheceu que uma das planilhas e as conclusões do laudo apontam para superfaturamento em março de 1997, quando o valor gasto com a compra de frango chegou a R$ 21,7 mil.

Mas o relator entendeu que quando se leva em conta os valores totais pagos, se destaca que o município, na verdade, economizou R$ 200 mil ao contratar a empresa. "Ora, considerando a dinâmica do mercado de commodities e o fato de que a proposta da empresa Ad’Oro permaneceu inalterada durante toda a vigência, era de se esperar que em alguns meses ela fosse mais vantajosa e em outros menos (em relação ao preço praticado no mercado), importando assim, para fins de cálculo, o resultado final", explicou o relator.

Diefenthäler destacou que ao apresentar proposta fixa e com prazo certo, as empresas que participam de licitação já levam em conta estas variáveis e fixam valor que pode ser aplicados durante toda a sua validade, somente pedindo reajustes em casos excepcionais.

Segundo o relator, o que aconteceu no caso da venda de frangos é que a empresa Ad’Oro desconsiderou as variações do mercado e manteve o preço do produto inalterado durante toda a vigência do contrato. "Isto certamente lhe trouxe mais ônus do que bônus, como aliás, concluiu o levantamento pericial", completou.

Julgamentos
No começo deste ano, por maioria de votos, o tribunal reformou a sentença de primeira instância condenando Maluf e os demais réus a ressarcirem aos cofres públicos a quantia de R$ 21,7 mil, além da proibição de contratar com o poder público, receber benefícios ou incentivos fiscais ou de crédito pelo prazo de três anos. Maluf, Marcelo Daura e Francisco Nieto foram condenados a perdas das funções públicas e a suspensão dos direitos políticos por cinco anos.

Os réus entraram com novo recurso no Tribunal de Justiça, desta vez para reformar a decisão com base no voto vencido do desembargador Barreto Fonseca. O novo julgamento provocou a reviravolta que absolveu nesta segunda-feira Maluf e os demais acusados. Segundo a tese vencedora, também por maioria de votos (três a dois), nos nove meses em que vigorou o contrato entre a prefeitura e as empresas para a compra de frangos houve uma economia de R$ 200 mil para os cofres públicos. O tribunal reconheceu que o único óbice contra a Ad’Oro era a de ele pertencer à mulher e a filha do então prefeito Paulo Maluf.

Votaram a favor da tese vencedora os desembargadores Nogueira Diefenthäler, Barreto Fonseca e Constança Gonzaga. Ficaram vencidos os desembargadores Moacir Peres e Coimbra Schmidt.

Consequência política
A decisão do Tribunal de Justiça pode beneficiar diretamente Paulo Maluf que passa a depender de manifestação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para confirmar sua reeleição a deputado federal. Nas últimas eleições Maluf recebeu 497 mil votos, que por enquanto estão contabilizados como nulos, já que a Justiça Eleitoral de São Paulo rejeitou o registro de sua candidatura. A diplomação dos eleitos este ano está prevista para a próxima sexta-feira (17/12).

Maluf foi enquadrado na Lei da Ficha Limpa pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de São Paulo em agosto e teve os votos considerados nulos. Pela norma, o candidato com condenação por improbidade, em segunda instância, como foi o seu caso, é impedido de concorrer. Ele entrou com recurso no TSE, para pedir o deferimento do seu registro de candidatura. O ministro Marco Aurélio é o relator do recurso.


Fernando Porfírio é repórter da revista Consultor Jurídico