sexta-feira, novembro 26, 2010

Dilma tinha 10,75 por cento de razões para demitir Meirelles, não esperava contar com a colaboração dele. Teleguiado pelo FMI, entra quem representou o Brasil 4 anos, nesse mesmo FMI. E já assume “pensando” nos juros.

Helio Fernandes

Continua se desenrolando (ou se enrolando, como quiserem) o ministério, que deveria se chamado de Dilma, mas na verdade, é tudo, menos dela. Convenhamos, não há nada mais tumultuado na vida pública do que organizar um ministério. Dilma está encontrando mais dificuldades agora, do que encontrou no primeiro e segundo turno da eleição.

Digamos, ela começou transitando por um caminho rigorosamente acertado, mas não sabia que encontraria tantos obstáculos. Sua primeira declaração, direta, pessoal, sem porta-vozes ou interlocutores (como Meirelles): “Quero controlar a área econômica, todos serão ligados a mim”. Perfeito, se não controlar essa área, pode até ser chamada de presidente, mas no mínimo dará ideia de gozação.

Além de manter a superioridade sobre o setor que tem repercussão sobre todos, Dona Dilma se afirmava sobre o hoje e o amanhã. O HOJE: podia preencher os outros ministérios com o mínimo de restrições. O AMANHÂ: com “ministros seus” se consolidaria, o governo teria a sua cara, e resistiria a tudo, repelindo ataques, viessem de onde viessem, de fora ou até mesmo de dentro.

A ideia da presidente eleita foi magnífica, e começou escolhendo um nome exato para o ministério da Fazenda, Guido Mantega. Tendo trabalhado esses anos todos com ele, não o conhecia bem, a recordação que ficara era de um personagem não agressivo, conciliador, que sendo hierarquicamente superior ao presidente do Banco Central, durante anos foi desautorizado por Meirelles até pessoalmente. Acreditou que seria fácil trabalhar com ele, poderia chamá-lo ao Planalto sem medo dele não ir, coisa que Lula jamais conseguiu com Meirelles.

Pois o grande erro de Dona Dilma, ocorreu precisamente com Lula. Cometeu o equivoco de contar ao ainda presidente, que iria manter Mantega como Ministro, Lula imediatamente encampou a idéia, se apropriou dela, concretizou-a como sua e não como de Dilma. Impressionante a habilidade e a capacidade de envolvimento de Lula.

Isso foi alguns dias antes da viagem (juntos) ao G-20, Lula logo “conversou” com Mantega, a sua colaboração no palanque principal desse grande acontecimento internacional. Dilma atirou certeiramente, mas quem atingiu o alvo foi Lula, que estava desarmado.

Lula imediatamente ampliou a jogada de Dilma, se apropriou dela. E concluiu-a com momentos que podem ser tidos como maquiavélicos. Para colocar Mantega no palanque, precisava tirar Celso Amorim, que há 8 anos o acompanhava nas viagens. Não era só o lugar no palanque.

Lula não gosta de dever nada a ninguém, estava incomodado com o fato de “todos pensarem” que seu sucesso, em parte, era do chanceler. Livrou-se dele na hora, sem conversa pessoal, apenas um telefonema de secretária para secretária, e o chanceler estava afastado da viagem. E além de afastado da viagem, vetado para a permanência que já considerava certa. Dona Dilma nasceu, cresceu e se afirmou politicamente ao lado de Lula e mostrou que não sabe nada sobre ele.

Assim, dando como concluída o que chamou “a formação da parte mais importante do meu governo”, olhou e o que viu foi “a cara do Lula, misturado com a submissão ao FMI”.

Dilma juntou Mantega a Tombini. O ministro da Fazenda já não era incondicionalmente dela. E o novo presidente do BC, vinha de lá de dentro mesmo, mas está tão ligado ao FMI quanto Meirelles.

Tombini não é banqueiro como Meirelles, é de carreira mas nada recalcitrante, que palavra. Em 2001, fim do segundo governo FHC, foi nomeado representante do Brasil no FMI. Portanto, até a sua origem não é lulista ou petista. Ficou 4 anos lá, em 2005, fim do primeiro mandato de Lula, Meirelles foi buscá-lo sem falar nada com Lula. “Autonomia” ou “Garantia”, servem para isso.

Lula não conhecia Tombini, continuou sem saber quem era. Também não sabe que em todas as decisões sobre aumento de juros (os aprovados e os recusados), Tombini votava com Meirelles com os envelopes (e os olhos) fechados. Tombini é um belo carreirista, mas não tem nada de brilhante, eclético ou multifacetado.

Tombini é homem de uma idéia só e também de fidelidade única. Daqui pra frente “vai dizer” que nem sabe quem é Meirelles. “Eu já existia, já estava no FMI, muito antes de Meirelles deixar a presidência do Banco de Boston e dominar, surpreendentemente, a economia do Brasil”.

Quando digo que Tombini “tem apenas uma ideia”, é o combate à inflação. Na verdade, uma das funções mais importantes do Banco Central é a inflação, é doença que se cura apenas com um remédio; aumento dos juros.

Mas como é economista com formação precária, “médica”, especialista em diagnóstico mas não na cura da doença. Examina o corpo, receita “aumento de juros”, e vai embora. Como estão falando muito em inflação, nada estranho que em fevereiro, ofuscado pelo carnaval e as férias, haja o primeiro aumento de juros do novo (?) governo.

Estão badalando muito os “três nomes” da área econômica, na verdade são apenas dois. Sem qualquer restrição a Miriam Belchior, o Ministério do Planejamento não existe na História brasileira. Foi criado na segunda ditadura oficial (Castelo Branco) sem a menor importância.

Nos 15 anos da ditadura Vargas, Souza Costa foi ministro da Fazenda 12 anos seguidos. Na segunda ditadura, o melífluo, esotérico, discreto, escandaloso e desonesto Delfim Netto, foi Ministro da Fazenda 12 anos e 6 meses, com três “presidentes”. (Costa e Silva, Médici e João Figueiredo).

Na Primeira e na Segunda República, planejamento (a palavra e o ministério) não existia. Dona Dilma recebeu auxílio poderoso de Meirelles, que pretendendo desequilibrá-la, acabou por fortalecê-la. E precisamente em cima dele, que não acreditava que pudesse ser demitido, sem sequer ser chamado ou comunicado.

***

PS – Amanhã continuo examinando o “Ministério chapa-branca”, como o do marechal Dutra em 1946. Ninguém sabia quem mandava, quem indicava quem. Quase a mesma coisa de agora, 64 anos depois.

PS2 – Numa afirmação estrondosa, ruidosa e até ruinosa, Dona Dilma afirmou publicamente; “Quero que em 1 ou 2 anos, os juros estejam em 2 por cento ao ano”. Já começa desaprovando e desautorizando o presidente indicado para o Banco Central.

PS3 – Para reduzir os juros a dois por cento ao ano, só um governo totalmente DEMOCRÁTICO, ou drástica e inconstitucionalmente TOTALITÁRIO. No momento, Dona Dilma transita entre as duas formas. Quando se decidirá?

Helio Fernandes |/Tribuna da Imprensa