sábado, setembro 25, 2010

Internautas fazem campanha pelo voto nulo para protestar nas eleições

Larissa Oliveira, do A TARDE On Line


O descrédito com a política nacional, a união em torno de uma ideologia “anarquista” e até mesmo a desinformação quanto a possibilidade de anular o pleito fazem com que muitos eleitores, ao longo dos anos, se articulem para defender o voto “em ninguém”. Em 2010, os adeptos da prática aproveitam para levantar a bandeira da anulação do voto nas redes sociais. No entanto, segundo a Legislação Eleitoral Brasileira, os votos nulos e brancos não são contabilizados no resultado final de uma eleição e os candidatos são eleitos apenas com base nos votos válidos. Neste contexto, as mobilizações possuem mais caráter de escracho do que de protesto.

Sr. Nulo, 39, é um dos adeptos do voto em ninguém. Paulista de São Bernardo do Campo, ele não revela a verdadeira identidade, mas é, desde 2006, dono da segunda maior comunidade do Orkut a favor da anulação do voto, a “Voto Nulo - Revolução Silenciosa” — que reúne mais de 7.800 participantes. Também mantém um blog homônimo à comunidade e criou, há pouco mais de um mês, o Twibbon — espécie de selo para a foto do perfil do Twitter, — “Vote Nulo”, já usado por 285 pessoas.

Para o internauta, que anula o voto desde 2004, o cúmulo da decepção com a política foi com o escândalo do mensalão, em 2005, quando até mandou uma carta ao presidente Lula pedindo explicações. “O que me motiva a votar nulo é a impunidade e o descaso que a classe política tem com as nossas necessidades básicas. Creio que a mobilização popular na internet pode assumir proporções inimagináveis”, defende.

Outro adepto da campanha pró-voto nulo é Rodrigo Fernandes, do site Jacaré Banguela. Ele lançou, na segunda semana de agosto, um vídeo de campanha para o fictício candidato Abelardo Ninguém. No vídeo, “Ninguém” cumprimenta moradores de rua e é apoiado pela população, que mostra com os dedos o número de candidato, 3003. O jingle do “candidato”, em ritmo de samba, apresenta o personagem com versos irônicos como: “Ninguém se importa com os seus problemas / Ninguém ajuda os desempregados” e “ Ninguém se importa com você / Ninguém quer seu voto / Ninguém faz por merecer!”.

Veja o vídeo “Vote em Ninguém”:

Opinião pública - O especialista em marketing digital da Magoweb, Sílvio Tanabe, acredita no poder das mobilizações digitais, mas pondera que a internet ainda não é forte a ponto de influenciar a opinião pública no Brasil. “Para se ter ideia, uma pesquisa recente realizada pela ComScore revelou que, enquanto 9% dos americanos acessam sites políticos, no Brasil esse número se restringe a 2%. Atualmente, o uso da internet é forte o suficiente para mobilizar grupos de interesse e comunidades, por meio de causas específicas”, analisa.

Sílvio Tanabe, no entanto, vê na internet a possibilidade de muita gente, principalmente os mais jovens, se envolver com política. “Temos de lembrar, contudo, que a internet é um meio e, por si só, não é capaz de mobilizar o interesse pela política. Quem deve fazer isso é a própria classe política, fazendo uso correto da internet para incentivar a participação dos jovens”, analisa.

Veja infografia com os votos brancos e nulos nas duas últimas eleições:

Contra a anulação - De maneira ainda pouco eficiente ou não, o voto nulo é apenas uma das bandeiras defendidas pelos internautas. Cientista político de Porto Alegre (RS), Antônio Roberto Vigne percebeu a quantidade de campanhas em favor da invalidação dos votos e resolveu, em 2004, criar a comunidade “Campanha contra o Voto Nulo” no Orkut.

Hoje, a comunidade já reúne 2.158 participantes, mas Vigne, o primeiro a levantar a bandeira na rede social, sofreu ataques de “adversários” no início. “Muitas pessoas que defendem o voto nulo me enviaram mensagens com xingamentos e chegaram a roubar dois perfis que eu tinha no Orkut. Foi bem complicado porque não tinha a proteção que a rede oferece hoje”.

Para Vigne, que teve de criar novos perfis, a maioria das pessoas que vota nulo é desinformada. “Elas acreditam que podem anular um pleito. O Código Eleitoral legisla sobre a nulidade eleitoral, que não tem nada a ver com o voto nulo. Uma urna é anulada por algum erro, algum processo de corrupção e, a depender da quantidade de urnas anuladas em determinada região, é feita uma nova eleição. Mas o voto nulo serve para nada”, argumenta.

Outro argumento do cientista político em defesa do voto consciente é a possibilidade de aumentar o coeficiente eleitoral e oxigenar o poder. “É a única chance que temos, apenas de dois em dois anos, de fazer alguma mudança . Votar nulo ajuda os corruptos a permanecerem onde estão. Acredito não só na força da internet, mas na força do voto, da conscientização de que votar vale a pena”, conclui.