“O presidente tem amadurecido uma ideia: tornar-se uma espécie de arauto da reforma política assim que deixar o Planalto”
O que fará Lula depois que deixar a Presidência da República? Ao que parece, somente um cataclismo de proporções diluvianas pode a essa altura alterar o panorama que aponta para a vitória de Dilma Rousseff, do PT. Mesmo a turma mais ligada a José Serra começa a reconhecer isso. Assim, é muito provável que Lula fará sua sucessora. E depois, o que virá?
Uma coisa parece certa na cabeça do presidente: ao contrário que diz Serra na sua propaganda eleitoral, Lula não pretende montar na garupa de Dilma Rousseff e continuar governando o Brasil por trás dela. Segundo um ministro muito próximo do presidente, Lula tem total confiança na capacidade administrativa de Dilma. E outros planos.
Segundo esse ministro, de saída o presidente tem mais de uma dezena de convites de universidades pelo mundo para receber títulos honoris causa. Deverá usar boa parte de seu período de quarentena após deixar a Presidência para aceitar esses convites. Para além disso, ele ainda não esboçou muitos planos. Mas tem amadurecido uma ideia: tornar-se uma espécie de arauto da reforma política.
Desde sempre, a discussão sobre a reforma política esbarrou num ponto. Por mais que se concorde que o atual modelo está esgotado, os próprios políticos sempre reagem a fazer qualquer mudança. Por uma razão simples: se alguém se beneficia com o atual modelo, são eles. Os políticos já sabem como agir para manter seus mandatos. A renovação do Congresso é baixa, em torno de 40%, a cada eleição. Então, para quem está no poder, o modelo é seguro. Mexer nele implica riscos. Por isso, a coisa empaca.
O modelo beneficia especialmente os principais partidos. E é com eles que o presidente, qualquer presidente, tem que negociar. Se depende dos votos desses partidos e esses partidos na prática evitam a reforma política, alguém no exercício da presidência fica sempre com dificuldade de virar ponta-de-lança de uma proposta de reforma política. Além disso, uma ideia que possa prejudicar os políticos partir do Poder Executivo pode ser interpretada como uma intervenção indevida.
Se não evolui no Congresso, se não pode partir do Executivo, como avançar numa proposta de reforma política? Lula tem dito que a possibilidade de avanço poderia estar na hipótese de alguém - ainda com comando e com credibilidade mas de alguma forma solto dos compromissos menores da negociação política - assumir o comando da discussão. Esse alguém poderia ser ele.
É claro que Lula conduziria essa discussão dentro do ponto de vista das mudanças que o PT prioriza. Incluiria especialmente o financiamento público de campanha e o modelo de lista fechada para a eleição de deputados estadual e federal. O financiamento público de campanha é uma certeza do PT – mas que também conta com adeptos em outros partidos, mesmo entre políticos conservadores (o deputado Ronaldo Caiado, do DEM, por exemplo, é favorável ao modelo) – de que é a única forma de baratear a eleição. Uma campanha de deputado federal já está chegando nestas eleições à absurda casa dos R$ 3 milhões. Mais do que R$ 3 milhões em dinheiro, são R$ 3 milhões em compromissos acertados sabe-se lá com quem e sabe-se lá com quais propósitos.
Já a lista fechada cai como uma luva nas pretensões petistas. O PT já é a legenda mais conhecida. Num tipo de processo em que se vota na legenda e se elege proporcionalmente a lista que o partido indica, é quem mais tem a se beneficiar. Na defesa do PT, porém, a lista fechada é um processo que fortalece o partido e diminui a possibilidade de distorção de um partido menor candidatar um Enéas ou um Clodovil e puxar com ele três ou quatro deputados com meia dúzia de votos.
Lula considera que sem as amarras das negociações políticas que envolvem o exercício da Presidência, ele poderá levar adiante os debates sobre a reforma política e, com a autoridade que terá, conduzir os parlamentares do PT e dos demais partidos aliados a se comprometerem com as mudanças necessárias.
Se conseguir fazer isso, Lula produzirá uma transformação que todo mundo concorda que é absolutamente necessária mas não consegue encontrar meios de fazer. Pode ser um ótimo meio de se manter em evidência e não cair no ostracismo.
Fonte: Congressoemfoco