Carlos Chagas
Se faltava um argumento final para a decretação da intervenção federal em Brasília, não falta mais. Esta semana assistiram-se episódios expressivos da falência da ordem pública na capital federal.
Terça-feira, bombeiros e policiais militares de todos os estados concentraram-se na Esplanada dos Ministérios e na Praça dos Três Poderes. Uma multidão. Até aí, nada demais. A capital federal foi criada também para servir de palco de protestos e reivindicações nacionais.
O diabo é que todas as manifestações, mesmo as monumentais, obedecem a um sistema ordenado. Das seis pistas de trânsito utilizadas para se chegar ao Congresso Nacional, bem como as outras seis para de lá sair, três de cada lado, sempre são liberadas para as passeatas, ficando as outras abertas ao tráfego. Assim, tudo vinha funcionando, ainda que com sacrifício para os milhares de funcionários, ministros, parlamentares e demais cidadãos obrigados a freqüentar tribunais, ministérios, Câmara, Senado e o palácio do Planalto. Até hoje Brasília não se imobilizou, sequer nos episódios mais quentes, como o da eleição de Tancredo Neves ou da decretação do Estado de Emergência, sem esquecer os múltiplos desfiles dos sem-terra.
Pois três dias atrás, bombeiros e policiais militares do país inteiro, numa justa reivindicação salarial, ocuparam as seis pistas para ir e as seis para voltar, na Esplanada, acampando nelas e nos gramados defronte às representações dos Três Poderes. As sete horas de caos no coração da cidade multiplicaram-se em mais de quatorze para quem tentava chegar ou sair das duas avenidas. Espraiando-se a confusão, também, pelas vias laterais e paralelas, num fenômeno jamais visto por aqui, interrompendo até quem se dirigia ao longínquo Lago Sul e outras regiões.
Por que essa caótica situação? Porque a Polícia Militar de Brasília, encarregada do trânsito e da ordem pública, não teve forças nem recebeu instruções para restabelecer ao menos parte da normalidade. Nem tanto por solidariedade corporativa aos manifestantes, mas pela falta de comando de um governador de brincadeirinha que ocupa a chefia do Distrito Federal.
Semanas atrás a truculenta cavalaria militar investiu contra grupos de estudantes que protestavam pela lambança comandada por um governador preso, secretários e deputados distritais. A agressão aos jovens foi um exagero, praticado em nome da ordem pública, já que eles sequer ocupavam pistas de trânsito, mas, apenas, os gramados. Na terça-feira, o contrário.
Eis apenas mais um exemplo de que a ordem pública está em xeque, por aqui. Porque nem se fala da confusão verificada todos os dias pela ausência de funcionários do Detran. Nas cidades satélites, virou aventura chegar em casa depois do sol. A Polícia Civil não consegue impedir o número crescente de assaltos e seqüestros. Os transportes públicos estão uma lástima. O desabastecimento já faz aumentar preços de gêneros de primeira necessidade. Falta autoridade no Planalto Central. Falta a intervenção federal.
Revelações
Na sessão solene do Congresso em homenagem aos cem anos de nascimento de Tancredo Neves, coube ao senador José Sarney fazer algumas revelações sobre o retorno do país à democracia, em 1985. Referiu-se a entendimentos do então presidente-eleito com chefes militares e confirmou os temores de que o presidente João Figueiredo não transmitiria o poder ao vice-presidente, como não transmitiu.
Informa-se que o presidente do Senado já concluiu suas memórias, ao menos no período da transição e de seu governo. Aguarda-se com expectativa.
Minas e a vice-presidência
Atribui-se a um assessor de Aécio Neves, felizmente mantido em cone de sombra, o comentário de que “Minas rejeita a vice-presidência da República, a última vez que isso aconteceu foi quando Aureliano Chaves ocupou o cargo, no governo João Figueiredo”.
Ou o assessor, se é que falou isso mesmo, ou o jornalista, que reproduziu o comentário, um dos dois precisa retornar imediatamente ao curso primário. Ou começar a ler jornais, porque o vice-presidente José Alencar é mineiro. E nem a honra de substituir o presidente da República deixou de pairar sobre Minas, porque José Maria Alckmin e Pedro Aleixo foram dois vices de primeira qualidade. Agora, se quiserem voltar a um passado mais distante, leiam sobre a República Velha…
Se o Congresso não faz…
Virou moda aceitar o raciocínio de que se o Congresso não legisla, cabe ao Judiciário preencher as lacunas da lei. Não há que contestar, apesar de lamentar. No caso, a omissão do Legislativo.
Cumpriu sua obrigação o Tribunal Superior Eleitoral ao dispor, esta semana, a proibição para doações ocultas nas campanhas eleitorais. Vai para as profundezas a possibilidade de empresários doarem recursos aos partidos e estes repassarem quantias a candidatos, sem precisarem informar à Justiça Eleitoral.
Mais ainda, que a internet deve divulgar os processos a que responde qualquer candidato.
Fonte: Tribuna da Imprensa