terça-feira, fevereiro 23, 2010

Paulo Octávio renuncia ao governo do Distrito Federal

Isolado, sem partido e sem sustentação política, governador em exercício chega à conclusão de que não tem como se manter no cargo. Enquanto Arruda estiver preso, governo será exercido pelo presidente da Câmara Legislativa

Renato Araújo/ABr
Isolado, sem apoio político, Paulo Octávio resolve renunciar ao governo do Distrito Federal

Mário Coelho

Desta vez é para valer. Isolado, sem apoio político, o governador em exercício do Distrito Federal, Paulo Octávio, resolveu renunciar. A permanência do empresário como governador não chegou a durar duas semanas. Desde que assumiu o cargo após o afastamento do titular José Roberto Arruda (sem partido), ele já tinha prometido renunciar e depois voltou atrás. Nesta terça-feira, Octávio oficializou sua saída do governo. Em carta lida pelo vice-presidente da Câmara Legislativa, Cabo Patrício (PT), ele disse que deixa o GDF por falta de apoio do DEM e de outros partidos políticos.

No início da tarde, Paulo Octávio, sem sustenção política e ameaçado de expulsão, deixou o DEM. Logo depois, a cidade foi invadida pela notícia que ele renunciaria à vice-governadoria também. A informação acabou confirmada por assessores de Octávio. Enquanto esperavam a carta de renúncia chegar, os distritais estavam reunidos na sala da presidência. Quando o secretário de Comunicação, André Duda, trouxe o documento, os parlamentares desceram para o plenário.

A sessão foi aberta pelo oposicionista Cabo Patrício. O presidente Wilson Lima (PR), que assume imediatamente e interinamente a chefia do Executivo da capital do país, não deixou sua sala. Com a presença de 12 deputados, o petista leu o documento de seis páginas. Nele, Paulo Octávio deixa claro que saiu do governo por falta de apoio em todas as esferas políticas de Brasília.

“Dediquei-me, nos últimos dias, a realizar consultas junto a líderes partidários dos mais variados matizes. Busquei a interlocução com figuras representativas da sociedade. As negociações apenas tornaram mais claras para mim as dificuldades de garantir, neste momento, a tão necessária governabilidade para o Distrito Federal”, afirmou Paulo Octávio na carta de renúncia.

"Circunstâncias excepcionais"

Para Paulo Octávio, ficar no cargo exigiria “circunstâncias excepcionais”. Ele disse que seria “imprescindível” contar com apoio político de vários partidos para tentar evitar a intervenção federal. “Além disso, seria imperioso construir uma agenda mínima de consenso com amplo respaldo na sociedade. Ainda mais fundamental seria estabelecer os interesses da cidade acima das ambições políticas em meio às paixões do ano eleitoral. E, não menos importante, teria que receber respaldo do meu partido”, afirmou.

O empresário, que foi deputado federal e senador antes de ser eleito vice-governador na chapa pura do então PFL em 2006,disse que pretende “oferecer às forças políticas a oportunidade de restabelecer seu poder e, sobretudo, ao apaziguar os ânimos, garantir ao brasiliense a recuperação de sua auto-estima”. “Quanto a mim, deixo o governo, saio da cena político e me incorporo às fileiras da cidadania”, disse.

Na carta, Paulo Octávio disse que sempre sonhou ser governador do DF, e que trabalhou para chegar no cargo, “mas em situação de plena normalidade”. “Não posso, nem devo, contribuir de nenhuma maneira para gerar desagregação e desassossego para o brasiliense. Não tenho receios. Respondo, tranquilamente, por todos os meus atos. Minha história é longa em Brasília, aonde cheguei em 1962”, afirmou.

Com a saída de Paulo Octávio e a prisão de Arruda, o próximo da linha sucessória é o presidente da Câmara Legislativa. No seu terceiro mandato como deputado distrital, Wilson Lima (PR) foi eleito para o cargo com a renúncia de Leonardo Prudente (sem partido) em janeiro. Ele fica como chefe do Executivo enquanto a situação do governador afastado não tiver definição. Na quinta-feira, o Supremo Tribunal Federal (STF) julga o mérito do habeas corpus pedido pela defesa do governador. Em caráter liminar, o ministro Marco Aurélio Mello negou a liberdade ao governador afastado. “O excelentíssimo senhor presidente da Câmara Legislativa possui as atribuições constitucionais para exercer as funções de chefe do Executivo”, disse Paulo Octávio.

Leia a íntegra da carta de renúncia:

Excelentíssimo Senhor
Presidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal
Excelentíssimos senhoras e senhores deputados distritais

Ao longo de duas décadas fui distinguido por servir ao Distrito Federal e a sua população. Durante esse período recebi apoio, consideração e a confiança dos eleitores dessa cidade que, em pleitos sucessivos, sufragou meu nome para deputado federal, senador e vice-governador.

Assumi, interinamente, o Governo do Distrito Federal com o propósito de colaborar para a superação da grave crise política que se abate sobre Brasília. Considerei desde o início que só poderia desempenhar essas funções se pudesse construir um possível consenso sobre a melhor maneira de vencer os atuais impasses.

Dediquei-me, nos últimos dias, a realizar consultas junto a líderes partidários dos mais variados matizes. Busquei a interlocução com figuras representativas da sociedade. As negociações apenas tornaram mais claras para mim as dificuldades de garantir, neste momento, a tão necessária governabilidade para o Distrito Federal.

Contudo, recebi manifestações de apoio e solidariedade de secretários, parlamentares, amigos, familiares, e de parte da população. Por essa razão, adiei por alguns dias o anúncio da decisão que há havia tomado. Diante dos desdobramentos recentes do processo político local, cheguei a uma conclusão definitiva.

Assim, por intermédio deste documento, comunico ao Presidente da Câmara Legislativa minha renúncia ao cargo de vice-governador do Distrito Federal. Assumi o Governo do Distrito Federal, de maneira interina, em condições excepcionalmente difíceis. O titular está privado de sua liberdade, por decisão judicial. No entanto, continua a ser o governo da cidade.

Pode, portanto, em tese, retornar às suas funções a qualquer momento. Não há sentido em aprofundar uma gestão nessas circunstâncias. Existem diversas obras, por toda a cidade, em fase de execução. São trabalhos contratados que possuem prazos e projetos definidos. Não deverão ser afetados pela situação política. É o que eu espero.

Permanecer no cargo, nas circunstâncias que chamei de excepcionais, exigiria a criação de condições também excepcionais. Imprescindível contar com apoio político suprapartidário para que todas as forças vivas do DF, juntas, pudessem superar a perspectiva de intervenção federal. Além disso, seria imperioso construir uma agenda mínima de consenso com amplo respaldo na sociedade. Ainda mais fundamental seria estabelecer os interesses da cidade acima das ambições políticas em meio às paixões do ano eleitoral. E, não menos importante, teria que receber respaldo do meu partido.

Nenhum dessas premissas se tornou realidade e, acima de tudo, o partido a que pertencia solicitou a seus militantes que deixem o governo. Sem o apoio do DEM, legenda que ajudei a fundar no Distrito Federal, e a qual pertenci até hoje, considero perdidas as condições para solicitar respaldo de outros partidos no esforço de união por Brasília.

Não é saudável para o governante, nem para os governadores, ver sua administração fragilizada. Sem que existam condições políticas, torna-se impossível permanecer à frente do Poder Executivo local, sobretudo, repito, em circunstâncias tão excepcionais.

Sempre sonhei ser governador do Distrito Federal. Trabalhei para alcançar esse objetivo. Mas em situação de plena normalidade. Não posso, nem devo, contribuir de nenhuma maneira para gerar desagregação e desassossego para o brasiliense.

Não tenho receios. Respondo, tranquilamente, por todos os meus atos. Minha história é longa em Brasília, aonde cheguei em 1962. Vivo aqui há 48 anos. Trabalho desde os 15. Aqui constitui família, aqui nasceram os meus filhos. Sou um legítimo candango.

Amo esta cidade. Conheço-a profundamente. Aqui estão minhas raízes e meu futuro. Por essas razões, decidi que o melhor a ser feito, neste momento, é deixar o honroso cargo de vice-governador do DF. O excelentíssimo senhor presidente da Câmara Legislativa possui as atribuições constitucionais para exercer as funções de chefe do Executivo.

Quero dizer que todos os esforços que realizei para garantir as condições mínimas de governabilidade tiveram como objetivo maior evitar que a autonomia política e administrativa do Distrito Federal venha a ser gravemente afetada por decisão judicial. Foi essa minha única motivação nos últimos dias.

Com minha renúncia, pretendo oferecer às forças políticas a oportunidade de restabelecer seu poder e, sobretudo, ao apaziguar os ânimos, garantir ao brasiliense a recuperação de sua auto-estima. Quanto a mim, deixo o governo, saio da cena político e me incorporo às fileiras da cidadania.

Que Deus ilumine nossas decisões e nossos atos.

Atenciosamente,

Paulo Octavio Alves Pereira

Fonte: Congressoemfoco