sexta-feira, janeiro 29, 2010

Alerta sobre remédio para emagrecer não é consenso

 / Saúde


Seguindo outros países, Anvisa contraindicou a sibutramina para cardíacos e diabéticos. Na Europa, recomendação é proibir a venda

Publicado em 29/01/2010 | Pedro de Castro

O alerta da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) a respeito da prescrição da sibutramina – um dos mais receitados remédios para emagrecimento – é motivo de controvérsia entre os profissionais de saúde: há quem considere as medidas adotadas em todo o mundo severas demais. No entanto, eles consideram que pouco deve mudar para quem segue à risca os parâmetros de uso da droga. A Anvisa contraindicou o uso da sibutramina para pacientes com histórico de doenças cárdio e cerebrovasculares e com diabete adquirida associada a risco cardiovascular, depois que ela sofreu restrições em outros países.

Nos últimos dias, a Agência Europeia de Medicamentos recomendou a proibição da comercialização da droga e a agência reguladora do setor nos Estados Unidos incluiu na bula do remédio a contraindicação para pacientes com problemas cardiovasculares.

Usuários exageram na dose

A sibutramina é facilmente adquirida sem receita com receptores de contrabando ou diretamente no Paraguai. “Pessoas que não precisam dela acabam usando-a em doses muito maiores do que os pacientes que têm receita”, lamenta o endocrinologista Henrique Suplicy. Os efeitos colaterais incluem insônia e dor de cabeça. “Se a pessoa tiver uma doença cardiovascular não diagnosticada, ainda corre risco de enfarte e derrame”, adverte o cardiologista Eduardo Saad.

A publicitária Amanda (nome fictício), 24 anos, não chegou a tanto, mas experimentou todos os efeitos colaterais. “Parei porque percebi que, para continuar sendo magra dessa maneira fácil, teria de tomar sibutramina o resto da vida. Cada vez que eu parava, o descontrole alimentar voltava e eu engordava. Era um ciclo sem fim”, relata. “Não existe milagre. A sibutramina é um facilitador para a dieta e a mudança de hábitos no longo prazo”, explica Suplicy.

As medidas foram tomadas com base em resultados preliminares da pesquisa Scout (resultados cardiovasculares da sibutramina, na sigla em inglês) realizada pelo laboratório Abbott, que desenvolveu a substância. Con­cluída no ano passado, a pesquisa apontou que o risco de desenvolver doenças cardiovasculares – como enfarte, derrame e parada cardíaca – aumentou em 16% nos pacientes que usaram a droga. O alerta da Anvisa é uma medida temporária. Em fevereiro, a Câmara Técnica de Medi­ca­mentos do órgão vai se reunir para decidir o que fazer.

O médico endocrinologista Henrique Suplicy, que participou da pesquisa Scout, considera que o estudo não muda o conhecimento sobre os riscos da sibutramina. Ele afirma que o trabalho foi desenvolvido em um grupo de alto risco – pacientes que não tomariam a droga de outra forma. “O medicamento é contraindicado para cardíacos, diabéticos e idosos. O Scout visava liberá-lo para essa população, mas as ressalvas parecem proceder”, observa. Suplicy diz ainda que é necessário esperar a publicação da íntegra do estudo e considera qualquer restrição precipitada. “O alerta da Anvisa já era conhecido pelos médicos, só provocou alarde.”

Para a presidente da secção Paraná da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, Victória Borba, o alerta da Anvisa é um reforço às contraindicações da bula, mas não modifica os grupos de risco. “Para o restante da população, basta manter as precauções já tomadas. Acontece que muitos médicos passam por cima das contraindicações”, diz. Victória indica que os pacientes em tratamento com sibutramina procurem seus médicos para avaliar se há necessidade de troca da medicação.

“Muitos médicos receitam sibutramina de forma indiscriminada”, critica o cardiologista Eduardo Saad. Ele considera o resultado do Scout previsível, uma vez que a sibutramina favorece o emagrecimento ao desacelerar a degradação de substâncias que atuam junto aos centros da fome e da saciedade do cérebro, mas que em altas concentrações são prejudiciais ao coração. “A droga não é para ajudar o jovem saudável a perder dois quilinhos, mas para combater a obesidade, que apresenta riscos à saúde, como as doenças cardiovasculares. Só que pessoas nessas condições não podem tomá-la”, diz.

Fonte: Gazeta do Povo