sexta-feira, novembro 27, 2009

Há 74 anos, a Revolução comunista de Luiz Carlos Prestes, toda errada. Sem planejamento, organização, recursos, não durou mais do que 72 horas

27 de novembro de 1935, uma data infrutiferamente histórica. Negativa. Insensata. Obsessiva. Tresloucadamente leviana, mas rigorosamente sincera e autêntica. Como foi toda a vida de Prestes. Jamais abandonou o mínimo de suas convicções, trocando-as por qualquer esperança, também mínima, de recompensa pelo Poder ou uma parte dele.
Depois da belíssima “Coluna Prestes”, um dos movimentos mais populares da nossa História, Prestes se asilou no Uruguai, depois de trabalhos como engenheiro, (sua formação profissional) na Bolívia. A “Coluna” não tinha objetivos de Poder, tanto que caminhou sempre para o Norte/ Nordeste em vez de vir para o Sul.
A intenção maior era combater Artur Bernardes, presidente em 1922. Equívoco dos grandes, Bernardes lutou a vida inteira contra os trustes. (Como se chamava na época. Governou em estado de sítio, durante os 48 meses de mandato).
O acordo entre todos os “tenentes” revolucionários, (Prestes era o único capitão, foi o mais jovem de toda a história militar) era acabado o governo Bernardes, se internarem nos países mais próximos. (Paraguai, Uruguai, Argentina, Bolívia, etc.). Ficou lá até 1930.
Em agosto desse ano recebeu a visita de Siqueira Campos e João Alberto, grandes amigos. Iam pedir a Prestes que chefiasse a “Revolução” que já estava preparada, faltava um chefe ou um líder com o carisma de Prestes. Ficaram estarrecidos quando ele perguntou, “essa Revolução é comunista?”.
Ora, esse movimento era o mais conservador possível, aburguesado como todos os “tenentes”. Com a exceção do próprio Prestes e de Agildo Barata Ribeiro. Ficaram mais um dia, voltaram para o Brasil, sofreram um desastre de avião em frente a Montevidéu, que levaria Siqueira Campos à morte. (Um dos mais brilhantes, mas isso é outra história).
Vitoriosa a “revolução” (as aspas são indispensáveis), os “tenentes” no Poder, Prestes não tomou conhecimento de coisa alguma. Nem contra nem a favor, estava completamente dominado por outra idéia. Essa idéia se concretizaria publicamente em 1932, quando lançou o “Manifesto Comunista”, que resumia seu pensamento social, político e econômico. A seguir viajaria para a União Soviética, durante 3 anos ninguém ouviu falar nele.
Em julho de 1935, Prestes aparece num seminário importante na Escola Nacional de Música, na rua do Passeio. (Hoje “tombada”, ao lado do também “tombado” Automóvel Clube, onde João Goulart faria o tresloucado e politicamente suicida discurso de 28 de março de 1964).
Ali se reuniam algumas das personalidades mais destacadas, civis e militares, de Carlos Lacerda ao comandante Hercolino Cascardo. A confusão era total, lutavam de “casa em casa”, contra ou a favor, ferrenhamente, mesmo que não soubesse para onde e contra quem atiravam.
Nesse ambiente de convicções as mais diversas, a predominância era de oficiais da Marinha, os famosos “comandantes”. Nenhum era comunista. O Globo fazia campanha violenta contra eles, rotulando-os de comunistas. (No auge da campanha e discursando nesse seminário, Cascardo desafiou Roberto Marinho ara um duelo, normal naquela época, herança da “cavalaria romântica” da idade Média. O dono de “O Globo” aceitou, designaram os padrinhos, marcaram para as 6 horas da manhã do dia seguinte, na Quinta da Boavista. Marinho não compareceu, não por medo, compreendam: em 1935 o trânsito era terrível, ele só conseguiu chegar ao local às 6 da tarde).
Prestes voltara ao Brasil única e exclusivamente para fazer a Revolução Comunista. Solteiro, veio com a ativista da violência, Olga Benário, como sua segurança. Tiveram relacionamento breve, chegados aqui, mal se viram. Ela mais ligada politicamente a Harry Berger, com que aliás, foi presa, já grávida.
Desorganizada, sem o mínimo de recursos, sem dinheiro e sem efetivos militares, a Revolução ficou apenas em municípios de Pernambuco, Rio Grande do Norte e Paraíba. E aqui no Rio no 3º RI (Regimento de Infantaria). Vitória em apenas uma cidade do interior do Rio Grande do Norte, a primeira na América Latina a ter um prefeito comunista. (A revelação desse movimento foi o “mitingueiro” Café Filho, que surpreendentemente chegaria a presidente da República, quer dizer, mais um vice que tumultuou a História do Brasil).
Prestes foi preso por acaso, meses depois na Rua Honório, no Meyer. Foi submetido à maior tortura que alguém sofreu no Brasil. Durante 4 anos ficou na Polícia Central, (onde o ex-Tenente Filinto Muller tinha seu gabinete de Chefe de Polícia) num vão de escada, fazia todas as necessidades ali, só saía para ir ao Tribunal de Segurança Nacional. Seu advogado, o jovem Sobral Pinto, designado pela OAB. O acusador, o carrasco Procurador Geral, que se chamava Himalaya Virgulino. (Com esse nome tinha que ter ódio da humanidade).
Em 1940, Prestes foi transferido para a Penitenciária da Frei Caneca, a pedido de Stalin. Nada surpreendente, o Brasil e a União Soviética eram aliados na Segunda Guerra Mundial. A partir daí, Prestes ficou em contato indireto com Vargas, geralmente através de Hugo Borghi. Um líder comunista, que pregava “uma nova forma de Poder, da produção e distribuição da riqueza”, dialogava com um dos maiores corruptos.
Em 1945, Borghi, falando em nome do ditador, propunha a Prestes, a “Constituinte com Vargas”. Aceitou, foi solto, fez um comício no Estádio do Vasco, (ainda não existia o Maracanã) atacando diretamente os quase 150 mil manifestantes que o ouviam. Prestes: “Vocês se aburguesaram, só pensam em conforto, em geladeira, um rádio maior”. (Ainda não havia televisão). A multidão chorava, foi embora desesperada.
Prestes não sentiu qualquer remorso, sentimento de solidariedade. Assim como não protestou quando Vargas entregou Olga Benário aos nazistas, não sentiu nenhuma aversão pelo acordo com Vargas. Veio a eleição de 2 de dezembro de 1945. Em plena campanha da “Constituinte com Vargas”, Prestes se elegeu deputado e senador pelo Distrito federal. Teve que optar, ficou como senador. Meu primeiro trabalho grande como repórter mocíssimo, foi a cobertura da Constituinte para a revista “O Cruzeiro”.
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PS- Prestes nunca mais se destacou. Durante os 6 meses da Constituinte, ficava perplexo com a camaradagem de Prestes-Plínio Salgado. Depois, na tribuna se agrediam.
PS2- Prestes tinha explicação para todas as posições contraditórias: “A vida pessoal na o pode influir nas questões que interessam à coletividade”. Até a morte se sacrificou por essa “convicção” que considerava certa. Não era, não é, nunca será.
Helio Fernandes /Tribuna da Imprensa