Faltam 4 meses (e poucos dias) para a desincompatibilização final e fatal, e a sucessão de 2010 é ainda um mistério total e impenetrável. Curiosidade (e contradição) que domina toda a República. Inicialmente não havia sucessão, quem escolhia, resolvia e decidia quem seria o candidato (apenas um) era o Partido Republicano.
Muitos se queixavam, os candidatos eram sempre de São Paulo (fora a absorção pela ambição dos marechais das Alagoas), só depois do terceiro paulista viria um mineiro.
Foi um puro acidente político, que resistiu apenas 2 anos e meio, o presidente que veio mudar a rotina, mudou mesmo, mas com a sua morte.
Era Afonso Pena, que morrendo em 15 de junho de 1909, levou mais um vice a presidência. Sendo que esse, Nilo Peçanha, transformaria tudo. Principalmente por causa da inimizade (verdadeiro ódio) com Rui Barbosa.
A primeira candidatura Rui Barbosa ocorreu em 1910, com Nilo Peçanha na presidência. E fazendo o possível e o impossível para eleger (e conseguiu) seu Ministro da Guerra, Hermes da Fonseca. (Sobrinho do primeiro presidente da República).
Isso durou até 1930, sem disputa, sem concorrência, com a eleição tão fraudada que ninguém conseguia explicar como aceitavam.
Esse jogo de cartas marcadas levou a 1930 e à ditadura Vargas, à derrubada do ditador, sua volta, o suicídio genial, e a inacreditável morte da Constituição de 1946, que não chegou aos 18 anos, assassinada antes da maioridade.
Ultrapassado esse período democrático, (vá lá) com apenas dois presidentes eleitos, nova ditadura, essa de 21 anos. O primeiro presidente (indireto) depois dessa tragédia da sempre inexistente democracia brasileira, não tomou posse, o lugar ficou com mais um vice.
Depois de todos esses fatos trágicos e alarmantes, veio o primeiro presidente eleito, que ficou pouco mais de 2 anos e meio. Sofreu o impeachment (o único da História) mais um vice assumiu a presidência. Mas o mais importante e não assinalado por ninguém, não foi o impeachment e o retrocesso de 80 anos em 8, com FHC como personagem central, mas sim o surgimento da Era Lula.
Começou em 1989, derrotado no segundo turno por Fernando Collor. Os empresários e a Organização Globo, vejam só, tinham pânico de Lula. Hoje se dão maravilhosamente com ele. (Como Vargas, pode muito bem ser identificado como o “pai dos pobres e a mãe dos ricos”).
Qualquer que seja a análise ou a conclusão, Lula dominou esses 20 anos. Derrotado seguidamente, não conseguiu ser eliminado. E agora, depois de duas vitórias, o presidente é ainda o personagem principal, atravancando o caminho de todos, na esperança de que esse caminho fique livre, aberto e desimpedido.
Para ele mesmo.
E é por causa de Lula que a sucessão não sai do lugar. Depois de perder duas vezes para prefeito de São Paulo, Ministro e senador por acaso, Serra chegou a 2002 como candidato a presidente. (Derrotado, como disse durante todo o processo, e como repito agora: não será presidente).
A partir daí, só age através de pesquisa. O mesmo fenômeno que atinge Dona Dilma, só que ela detesta pesquisa, que marca impiedosamente a sua falta de vigor e de energia em matéria de ascensão eleitoral.
Lula está completando 20 anos como um extraordinário jogador de xadrez que jamais viu um tabuleiro na vida. Por isso ele exibe tanta tranquilidade. Os outros se desesperam, se matam, sofrem, sabem que dependem inteiramente de Lula que é o senhor de suas vontades e a dos seus destinos. Além de não abandonar, por um minuto que seja, sua obsessão, ambição e constatação.
De que pode continuar.
Esse é o quadro. Dois candidatos cheios de aspas e paetês. Um maestro que insiste em manter o teatro completamente vazio, acha que sua regência se exerce muito melhor assim.
Se dou importância à desincompatibilização, é porque quase todos dependem dela. E alguns, submetidos a ela, podem se despedir para o nada. É o caso de Dona Dilma.
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PS- Serra está concentrado em não sair da vida pública (como já disse) pode permanecer mais 4 anos no segundo cargo em importância. Se ele sair, será presidenciável. Se ficar, disputará o governo de São Paulo.
PS2- Lula, nada a ver com desincompatibilização. Constitucionalmente seu tempo já se esgotou. Mas quem disse que Lula liga ou acredita em Constituição?
Helio Fernandes /Tribuna da Imprensa