Carlos Chagas
Do jeito que as coisas vão, só falta o exército de Honduras invadir a embaixada do Brasil em Tegucigalpa. Já jogaram bombas, cortaram água, luz e telefone e impedem a entrada e saída de funcionários. Contrariam princípios seculares de convivência entre as nações, porque desde a Paz de Westfália, em 1648, encerrando a Guerra dos Trinta Anos, que embaixadores e embaixadas tem preservadas sua integridade e sua prerrogativa extra-territorial. Até Adolf Hitler respeitou os diplomatas da Inglaterra em Berlim, garantindo passe livre ao embaixador para chegar a seu país e sem apropriar-se da embaixada.
Do jeito que as coisas vão nessas terras cucarachas, qualquer dia desses os pelotões hondurenhos saltarão o muro da nossa representação e prenderão o ex-presidente Manoel Zelaya, lá asilado. Haverá saída senão a declaração de guerra? Alguma coisa parecida com o enredo daquele maravilhoso filme da década de sessenta, “O Rato que Ruge”, com Peter Sellers. Levaríamos seis meses só para uma corveta da Marinha chegar à América Central, mas uma dúvida ficaria em aberto: e se eles ganhassem?
Ciúmes aeronáuticos
Humor à parte, apesar da histriômica questão com Honduras, a verdade é que temos obstáculos muito mais importantes para enfrentar no plano internacional. Um deles exprime-se na questão da compra dos 36 caças de última geração para a Aeronáutica. Precipitou-se o presidente Lula, na noite do Sete de Setembro, ao anunciar a decisão em favor da proposta francesa pelos Rafale, quando examinávamos, e ainda examinamos, as ofertas dos Estados Unidos e da Suécia. O governo precisou voltar atrás.
Há uma explicação para o gesto virtual do primeiro-companheiro. Naquela manhã, na Esplanada dos Ministérios, durante o desfile cívico-militar, tudo eram sorrisos entre os presidentes Nicolas Sarkozi e Lula. Foi quando um adido militar da França saiu lá do fundo do palanque, aproximou-se do seu presidente e cochichou alguns minutos. As tropas terminavam de passar e aguardava-se a exibição das esquadrilhas-da-fumaça do Brasil e da França, ponto alto da comemoração. Acontece que nosso ilustre visitante fechou o cenho e escafedeu-se. Gerou grande surpresa no colega brasileiro, que seguiu atrás dele, levando-o até o carro. O Lula não teve outro remédio senão retirar-se também.
A causa da retirada? Ciúmes aeronáuticos. No 14 de julho, em Paris, a esquadrilha-da-fumaça brasileira foi impedida de evoluir sobre o Champs-Elisées, sob pretextos de segurança. Assim, o brigadeiro encarregado do setor, aqui no Brasil, pagou na mesma moeda: os ases franceses estavam autorizados apenas a uma passagem sobre a Esplanada dos Ministérios, o que fizeram muito bem, espalhando as cores da bandeira de seu país e recebendo aplausos da assistência. Mas nenhuma evolução foi permitida, como antes programado. Sarkozi irritou-se e foi embora.
Pouco depois, no palácio da Alvorada, o presidente Lula e os ministros Celso Amorim e Nelson Jobim arrancavam os cabelos para saber como contornar aquele incidente diplomático. E saiu a solução: o Brasil deveria demonstrar de imediato preferência e até decisão pela compra dos caças franceses, notícia que a imprensa divulgou com amplo destaque. Só que depois vieram as consequências: o ministro da Aeronáutica estrilou, ameaçou demitir-se, porque o estudo das opções de compra não estava pronto; os Estados Unidos e a Suécia protestaram, exigindo evidências de que ainda estavam na disputa.
Com todo o respeito, uma lambança dos diabos, com resultado ainda inconcluso na questão dos aviões de caça…
O número mais importante
Deixamos assentar a poeira da mais recente pesquisa eleitoral, do CNI-Ibope, para arriscar um comentário. Há conclusão mais importante do que assistir José Serra mantendo a liderança, Ciro Gomes assumindo o segundo lugar e Dilma Rousseff caindo nas preferências populares, enquanto Marina Silva sobe. Graves, mesmo, são os números de rejeição, que atingem todo mundo, ainda que mais fundo a candidata do PT. Dilma chegou a 40%, Serra a 25%. Parece a demonstração de estar o eleitorado insatisfeito com todos. Enquanto isso a perigosa indagação permanece não sendo feita: e se o candidato for o Lula? Os 81% de aprovação do presidente da República responderiam com facilidade. Uma demonstração de que o povo não está nem aí para a perspectiva de golpes de estado…
O grande argumento
Do encontro não propriamente ameno entre Michel Temer e Orestes Quércia faltou a referência a um argumento que o ex-governador de São Paulo expôs ao presidente da Câmara, mas não foi transmitido à imprensa.
“Você vai mesmo entrar numa fria?” – perguntou Quércia a Temer. O raciocínio foi para impedir a decisão antecipada da maioria do PMDB de apoiar Dilma Rousseff e indicar Temer como seu companheiro de chapa ainda em outubro. Caso o partido oficialize essa tendência, e se Dilma não decolar, o presidente da Câmara ficará pendurado no pincel, sem escada. Não poderá candidatar-se a mais um mandato na Câmara dos Deputados e nem permanecer na presidência da casa no próximo biênio, de 2011-12.
Ignora-se como Temer recebeu o alerta. Por enquanto, não há decisão sobre a oficialização da candidatura Dilma pelo PMDB e a indicação do vice. Resolveram todos aguardar o retorno do presidente Lula do exterior.
Fonte: Tribuna da Imprensa