Carlos Chagas
Com o Lula novamente no ar, voando para Copenhague, voltam-se as atenções para sexta-feira, quando na capital dinamarquesa o Comité Olímpico Internacional decidirá onde se realização as Olimpíadas de 2016. Não chega a caracterizar um inusitado a presença do presidente brasileiro na platéia onde estarão, além dos torcedores pelo Rio de Janeiro, os partidários de Chicago, Tóquio e Madri. Se o Obama não vai, nem o imperador do Japão ou sequer o rei da Espanha, problema deles. O nosso chefe encabeça forte delegação integrada pelo governador e o prefeito do Rio, o Pelé, diversos artistas e atores, além de vencedores de medalhas de ouro nas últimas Olimpíadas.
A pergunta que se faz é delicada: e se o Rio perder? Terá valido à pena a presença do Lula? Ou a frustração será debitada ao Cristo Redentor, diante do qual reuniram-se no último domingo até o cardeal arcebispo do Rio, entre o governador e o prefeito, todos contritos rezando o Padre Nosso?
Discutir se a antiga capital estará preparada para abrigar a nata do atletismo mundial, mais milhares de jornalistas, turistas e curiosos é outro problema. Segurança pública, transportes coletivos, acomodações, facilidades de comunicação e outras necessidades precisarão ser equacionadas nos próximos anos, caso a decisão de Copenhague nos favoreça. Singular, mesmo, é verificar a movimentação nacional estabelecida em torno da competição esportiva, ainda que posicionada entre as maiores do planeta. Não se vê empenho igual de nossos governantes diante das questões a merecer antecipadamente cuidados maiores. O combate à violência e à escalada do crime organizado, por exemplo, ironicamente atingindo o Rio com impacto invulgar. A carência nos meios de transporte, onde os metrôs em nossas capitais perdem em número e em extensão para cidades que nem pensam sediar Olimpíadas. A reduzida oferta da rede hoteleira nacional e carioca, para não lembrar o alto preço e a deficiência de nossos meios eletrônicos de comunicação.
Não seria preferível que antes de pleitearmos sediar a grande competição futura, tratássemos de oferecer as condições necessárias à sua realização? Porque só o banho de mar à disposição dos atletas vitoriosos, como se vangloria o presidente Lula, não basta. Pobre Cristo Redentor, caso o Brasil não conquiste a primazia olímpica. Vão jogar a culpa Nele…
Vão insistir em Requião?
A ministra Dilma Rousseff estará hoje em Curitiba para vistoriar obras do PAC e comparecer a outros eventos. Deve jantar com o governador Roberto Requião, buscando aparar arestas capazes de afastá-lo da sucessão presidencial, caso o palácio do Planalto insista em apoiar para o governo do Paraná um candidato por ele reprovado. No caso, o senador Osmar Dias. Há, no governo, quem imagine poder caçar e conquistar o governador com uma compensação: ele é do PMDB, partido ao qual será oferecida a vice-presidência na chapa do PT.
Deixaria Requião envolver-se pela perspectiva de ocupar o palácio do Jaburu no próximo mandato? Primeiro, seria bom que Dilma Rousseff crescesse nas pesquisas e demonstrasse condições de ir para o segundo turno das eleições do ano que vem. O governador dispõe de todas as chances de eleger-se para o Senado, que acentua seu objetivo. Além do mais, não é propriamente persona grata entre os dirigentes de seu partido, os mesmos que por duas vezes o garfaram quando apresentou-se para disputar a indicação para presidente da República. Três semanas atrás, jantando com o Lula e com Dilma no palácio da Alvorada, Requião só não deixou inconcluso o cardápio, elogiando o coelho “à caçadora” mandado preparar pelo anfitrião. Hoje, o mesmo bicho será servido no palácio Iguaçu, mas pela caça…
Lambança igual nunca se viu
O presidente interino de Honduras, Roberto Micheletti, deu prazo de dez dias para o Brasil decidir a situação jurídica do presidente deposto daquele país, Manoel Zelaya, hóspede em nossa embaixada em Tegucigalpa. O presidente Lula declarou não aceitar ultimatos e nem reconhecer o governo golpista em exercício naquele país. O presidente Hugo Chavez, da Venezuela, responsável pelo ingresso de Zelaya em nossa embaixada, respalda retoricamente o Brasil, mas não põe sua embaixada à disposição do refugiado. Enquanto isso o presidente Barack Obama, dos Estados Unidos, cruza os braços e manda dizer que o presidente Lula precisa adotar um tom mais firme na condenação do programa nuclear do Irã.
O resultado é uma lambança dos diabos, daquelas que seriam cômicas se não fossem trágicas. Porque Honduras, para quem não sabe, importa menos no cenário mundial do que a reserva Raposa-Serra do Sol, com todo o respeito aos nossos índios…
Quarenta anos atrás
O Brasil vivia uma de suas piores crises institucionais, precisamente há quarenta anos. O então presidente Costa e Silva havia sido acometido por um derrame cerebral, dias antes de reabrir o Congresso posto em recesso e considerar revogado o Ato Institucional número 5. O vice-presidente Pedro Aleixo, em vez de substituí-lo, foi preso pelos três ministros militares, que usurparam o poder. A reação dos oficiais-generais foi intensa, não por se incomodarem com o golpe, mas porque imaginavam, quase todos, ocupar sozinhos as funções de Costa e Silva. As discussões pareciam intermináveis quando, nesse meio tempo, a esquerda radical seqüestra o embaixador dos Estados Unidos no Brasil. Washington, sem know-how para seqüestros, obriga a Junta Militar a cumprir todas as exigências dos sequestradores, entre elas a de mandar para o México vinte presos políticos e de obrigar Cid Moreira, no Jornal Nacional, a ler um manifesto subversivo. No final, é escolhido o general Garrastazu Médici para presidir o país, considerando-se extintos os mandatos dos presidente e vice-presidente. O AI-5 não foi revogado, mas reafirmado e utilizado ao infinito.
Quando a gente lembra esses episódios, quatro décadas depois, dá vontade de agradecer a Deus, porque nunca mais se repetiram…
Fonte: Tribuna da Imprensa