Dora Kramer
Desde a famosa entrevista do senador Jarbas Vasconcelos à revista Veja, em fevereiro, dizendo que o PMDB “não tem bandeiras” e, em sua maioria, só se interessa por corrupção e fisiologismo, dirigentes do partido passaram a se preocupar com uma possível queda no valor de suas ações no mercado eleitoral.
Até então, o PMDB era visto como o mais cortejado, o mais poderoso, mais espetacular e fundamental aliado das eleições de 2010, disputado por candidatos de governo e de oposição.
Saíra das eleições municipais valorizado por importantes e abundantes vitórias, acabara de eleger os presidentes da Câmara e do Senado, em suma, um troféu intensamente cobiçado. Naquele momento ninguém falava dos seus decantados defeitos, só se celebravam suas qualidades de legenda mais bem organizada e presente em todo o país. Era a glória.
Mas aí veio Jarbas Vasconcelos e lembrou de detalhes explícitos na metodologia pela qual o PMDB galgara degraus em direção ao topo. Na ocasião, houve mesmo quem interpretasse a manifestação como um ato deliberado do senador, um assumido aliado da candidatura José Serra no PSDB, para afastar o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, que, segundo a direção do PMDB, naquela altura retomava conversas sobre a possibilidade de se filiar ao partido para se candidatar à Presidência.
Aécio, na época, negou não só a intenção de abandonar a seara tucana, como também a existência de qualquer conversa nesse sentido com o PMDB. O tempo tanto confirmou a versão de Aécio, quanto corroborou as preocupações dos dirigentes do PMDB.
As desventuras desabaram em série sobre o partido: denúncia de corrupção na Funasa, na voz do ministro da Saúde; repúdio dos funcionários de Furnas às investidas peemedebistas sobre o fundo de pensão da empresa; reclamações do PT contra a ambição do companheiro de aliança; e, para completar a fase infernal, a crise no Congresso.
Os escândalos sem fim pegaram o PMDB no comando das duas casas. Não havia, portanto, como empurrar a conta para o vizinho. Na Câmara, o presidente licenciado do partido, Michel Temer, ficou à frente das cobranças sobre a farra das passagens aéreas. E, no Senado, José Sarney, viu seu sonho de coroar a carreira em figurino de majestade, virar um pesadelo de infortúnios.
Os concorrentes de 2010 continuam a cobiçar o PMDB. O partido segue sendo um parceiro valioso. A questão que se impõe internamente, no entanto, é a seguinte: até que ponto seu cacife foi desvalorizado?
Há valor na conquista do PMDB. Mas, tirando o tempo de televisão proporcional ao tamanho de suas grandes bancadas no Congresso, o que tem o partido a oferecer?
Será ainda uma boa companhia de palanque ou já terá se tornado um parceiro pesado, dono de má fama difícil de carregar? Depende do uso pretendido. Para as funções de cozinha, o horário gratuito, vale muito. Mas, para apresentar às visitas (o eleitorado), há fortíssima controvérsia.
Sinuca
A solução para o caso dos atos secretos, reconheça-se, não é fácil. Requer firmeza e certa dose de ousadia. Pelo seguinte: os atos existem, as assinaturas dos executores estão expostas, mas ainda falta apontar os mandantes. Senadores, obviamente.
Como há parlamentares que realmente os desconheciam, não faz sentido responsabilizar o colegiado que, no entanto, está levando a fama. Isso tende a aumentar a tensão interna e a pressão pela identificação dos culpados.
Tempo que ruge
Depois de decidir à revelia do partido que Dilma Rousseff seria a candidata presidencial do PT, Lula invocou o direito de resolver, em nome do PMDB, que o candidato a vice na chapa, deve ser Michel Temer. Como já absorveu também a tarefa de escolher os estados onde o PT terá, ou não, candidato a governador, não seria surpreendente se o presidente pretendesse também interferir nas candidaturas estaduais do PMDB.
Lula centraliza a armação do jogo de 2010, a fim de evitar que os partidos envolvidos percam tempo e energia em processos de discussão e até disputa internas. Teria, com isso, uma vantagem em relação à oposição, cuja decisão – pelo menos em tese – ainda depende da composição de forças no PSDB.
Do ponto de vista estritamente pragmático, o sistema pode ser eficaz. Mas, sob a ótica da autonomia e, portanto, do fortalecimento dos partidos, o modelo autocrático resulta em retrocesso. De todo modo, Lula luta contra o tempo, pois uma coisa é a docilidade dos partidos aliados agora, a 15 meses da eleição. Em anos anteriores, nessa altura não havia candidatos dados como certos.
Outra situação bem diferente é aquela pauta pela conta de conveniência feita à medida que esse prazo encurta na proporção direta da redução do tempo de permanência no poder do governante em fim de mandato. Daí a pressa.
Fonte: Gazeta do Povo