Editorial
Velho incentivo a toda sorte de aproveitadores do dinheiro público, a impunidade está deixando de ser o pior dos males do país. Acaba de ser suplantada pela premiação oficial aos bandidos. Talvez o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não tenha percebido a dimensão do que estava produzindo, ao assinar, às vésperas de viajar ao exterior, a Medida Provisória 446. Mas é exatamente esse o absurdo que está contido no texto já em vigor. Com aquela canetada, Lula simplesmente decretou a anistia ampla, geral e irrestrita a mais de 2 mil entidades ditas filantrópicas que corriam o risco de ter os certificados cassados, sob a acusação de falsidade e de desvio de verbas públicas, entre outras falcatruas. E, com o prêmio pelo mau comportamento, ficarão dispensadas de pagar vários tributos, como PIS, Cofins e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e até o recolhimento ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Trata-se de renúncia fiscal, que só no ano passado impediu a entrada de R$ 4,4 bilhões nos cofres da União.
A benesse veio embrulhada na bem-intencionada e saneadora mudança que transfere do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), do Ministério do Desenvolvimento Social, para cada ministério de atuação das filantrópicas a responsabilidade de conceder e renovar os certificados que as credenciam a receber e aplicar verbas de programas públicos. Muitas estavam com suas credenciais vencendo no mês que vem e dificilmente conseguiriam renová-las, já que foram apanhadas em março pela Operação Fariseu, da Polícia Federal (PF), desviando verbas públicas para contas privadas. O próprio CNAS também esteve sob investigação, pois, segundo denúncias, teria abrigado um grupo de espertalhões especializado em conceder certificados a entidades que se passavam por filantrópicas apenas para receber as verbas do governo, sem a menor intenção de dar a elas o destino para o qual eram liberadas.
Ao renovar automaticamente todos os certificados das entidades filantrópicas que dizem prestar serviços à administração pública, a medida joga no lixo o trabalho de apuração e denúncia da PF. Não importa que, à época, tenha sido amplamente divulgado, causando natural indignação à opinião pública. Há até uma linha de apurações aberta no Senado Federal pela comissão parlamentar de inquérito que investiga as organizações não-governamentais (CPI das ONGs). Antes de oferecer ao presidente tão incoveniente texto para assinatura, seus verdadeiros autores poderiam, sem dificuldade e com base nos dados da PF, excluir os desonestos, em vez de premiá-los Como não o fizeram, dão o direito de ser colocados sob suspeição. Se não for retirada do Congresso Nacional ou reprovada pelos parlamentares, a equivocada MP apaga o histórico de bandalheiras e veda a possibilidade de recuperação, pela Receita Federal e pela Previdência Social, dos recursos não recolhidos. Por fim, ridiculariza as entidades honestas a quem a sociedade deve trabalho elogiável que sempre vincularam a isenção fiscal e a aplicação das verbas que recebem às exigências da lei e às práticas da transparência.
Fonte: Estado de Minas (MG)