Cientista político analisa a disputa eleitoral no Rio e garante que pesquisa não influi no voto
O cientista político Geraldo Tadeu Moreira Monteiro, diretor-presidente do Instituto Brasileiro de Pesquisa Social (IBPS), aponta que a fragmentação do quadro político no Rio, com a disputa entre 12 prefeitáveis, se constitui um componente de grande instabilidade no voto do eleitor. De acordo com a última pesquisa divulgada pelo instituto na semana passada, uma parcela considerável do eleitorado esta indeciso sobre o candidato em que irá votar no próximo domingo. Dos que já se decidiram, 37% admitem que ainda poderão mudar de opinião. "Quando vamos ao supermercado e nos deparamos com muitas ofertas de um determinado produto, às vezes ficamos em dúvida sobre qual deles levaremos", compara Tadeu.
O cientista político explica que o avanço nas pesquisas do candidato Eduardo Paes (PMDB) nas últimas semanas se deve a um conjunto de fatores, a exemplo do apoio do governador Sérgio Cabral, dos secretários e pessoas que têm cargos estaduais, a disposição de uma coligação com partidos fortes e com grande capilaridade, além de ser uma pessoa razoavelmente conhecida. "Tudo isso contribui para o seu crescimento e indica que seja um dos que irão para o segundo turno", diz.
Geraldo Tadeu é taxativo ao desmistificar certos mitos, e afirma que nem pesquisa ou o horário eleitoral gratuito são capazes de mudar de forma significativa a opinião do eleitorado. "Todas as pesquisas que fiz até hoje, relativas ao horário eleitoral gratuito, me deram rigorosamente o mesmo resultado. Assiste quem já tem candidato e o faz para torcer por ele. (...) Um dos grandes mitos da eleição é dizer que pesquisa influencia o eleitor. Não influencia em nada. Infelizmente. Porque senão eu estaria rico ou eleito", assinala.
O diretor do IBPS acrescenta ainda que o segundo turno das eleições no Rio provavelmente deverá ser palco para a disputa entre o candidato peemedebista com um dos três prefeitáveis mais bem colocados nas últimas pesquisas, Marcelo Crivella (PRB), Fernando Gabeira ou Jandira Feghali (PCdoB). Geraldo, entretanto ressalta, que apesar das possíveis coligações, não se pode esperar que os eleitores sigam necessariamente as indicações das lideranças. "Pelas pesquisas, notamos que o partido pode apoiar, mas o eleitor não segue as orientações (...) Temos uma visão muito equivocada do eleitor. Ele não é `pobrezinho', inconsciente, ou vaquinha de presépio. Estou na ponta do processo e vejo que não. O eleitor está longe de ser bobo", afirma.
Marcelo Copelli
TRIBUNA DA IMPRENSA - De acordo com a última pesquisa divulgada pelo instituto, quase metade dos entrevistados ainda não tem candidato a prefeito para as próximas eleições no Rio. E dos que já têm, uma parcela considerável não mostra ainda firmeza de ir com a decisão até as urnas. O senhor diria que diante de tais índices, nada estaria definido e poderíamos ter surpresas?
GERALDO TADEU - Acredito que há um grau de surpresa. Na pesquisa espontânea realmente 42% não sabem em quem vão votar. Além disso, mais 6% não responderam a essa pergunta, totalizando 48%. Ou seja, cerca de um em cada dois eleitores não está absolutamente decidido. Quando vamos nas estimuladas, esse grau de indecisão cai para 13%. Com isso, podemos dizer que algo entre 13% e 48% dos eleitores está indeciso. Outro dado importante é que dos que se decidiram, 37% acham que ainda podem mudar. Temos aí um componente de instabilidade grande nesse voto. Em comparação com outras capitais, aqui o cenário está muito fragmentando. Se olharmos Belo Horizonte, Salvador, Porto Alegre, por exemplo, temos três ou quatro candidatos disputando. Aqui são 12. Uns com 9%, outros com 4%, com 3%, de tal forma que podemos ter no segundo turno um candidato com 15% dos votos.
Esse componente de fragmentação pode estar levando o eleitor a ficar um pouco indeciso também. Quando vamos ao supermercado e nos deparamos com muitas ofertas de um determinado produto, às vezes ficamos em dúvida sobre qual deles levaremos. Outra coisa que observamos desde o início da campanha é o fato de estar havendo o movimento de um candidato para o outro. Particularmente, nos últimos 20 dias, vimos uma migração do Marcelo Crivella (PRB) para o Eduardo Paes (PMDB). Fizemos alguns cruzamentos em nossas pesquisas que mostraram que exatamente na mesma medida que o Crivella caía o Paes subia, nas mesmas regiões. Ele foi crescendo sobre eleitores do próprio senador. Em julho, o Crivella tinha em nossas pesquisas 28%, que é basicamente o que o Eduardo tem hoje. E, ao mesmo tempo, o peemedebista tinha 13%, que é um pouco menos do que o candidato do PRB tem atualmente.
De acordo com os dois relatórios de prestação de contas de campanha, entregues em agosto e setembro ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o candidato Eduardo Paes já gastou R$ 477.580 com pesquisas e testes eleitorais. Ao mesmo tempo, ele teve um grande crescimento eleitoral nas última semanas. Como se dá a relação entre o uso intensivo de tais informações e o seu avanço nas pesquisas?
O aporte que a pesquisa traz não é direto. A campanha dele tem recursos suficientes, e parece que arrecadou algo em torno de R$ 3 milhões. O valor gasto com pesquisas corresponde aproximadamente ao que a gente recomenda que um candidato deva gastar, que é entre 10% e 15% do orçamento. Assim, não há exageros em termos percentuais. É importante ressaltar que hoje temos instrumentos para detectar movimentos muito rapidamente.
Fazemos, atualmente, uma coisa chamada "tracking", que permite com que apresentemos diariamente uma pesquisa inteira, com resultados capazes de ir apontando tendências. O candidato poderá saber se está subindo ou descendo, detectar se o seu adversário está crescendo, onde e por quais motivos. Quanto mais informação, maior a rapidez com a qual se pode reagir a diferentes situações ao longo do processo. Assim a pesquisa ajuda indiretamente, pois fornece um quadro bastante sofisticado, permitindo à coordenação da campanha se estruturar e retificar os rumos.
Quais os pontos teriam aberto essa vantagem para o atual líder nas pesquisas, na sua opinião, já que o quadro mudou sensivelmente nas últimas semanas, no qual tínhamos o senador Crivella na liderança das pesquisas?
O crescimento em uma campanha eleitoral não vem por acaso ou por um fator específico. Existe uma tendência muito grande entre os intelectuais e nos meios de comunicação de querer explicar um movimento por um único fator. Podemos dizer que, no caso do candidato que atualmente lidera as pesquisas, todos os fatores contribuem para que ele cresça. Ele tem o apoio do governador, e isso não é pouca coisa. Embora o maior eleitor do Rio seja o Lula, ele não está atuando na campanha. Então, excluído o presidente, o segundo maior eleitor é o Sérgio Cabral.
Além disso, temos toda a máquina estadual. Não que ele a esteja usando em benefício próprio, mas ele tem os secretários, pessoas que têm cargos estaduais, que aparecem, marcam reuniões e usam do seu prestígio político. Existem também os fatos do Paes ter uma coligação com, pelo menos, três partidos fortes e com grande capilaridade, o PMDB, o PTB e o PP, e dispor de uma campanha muito bem estruturada, profissionalizada. O pessoal que faz a parte de comunicação foi o mesmo que realizou a campanha do Sérgio Cabral.
Até onde sei, ele contratou uma equipe, delegou poderes e cobra resultados. Ele não se imiscui no dia-a-dia da campanha, que é o que todo consultor político recomenda. O candidato tem que ficar livre para fazer política e não se preocupar se o material de campanha está chegando na Zona Norte, por exemplo. Assim, o peemedebista não só conta com tais fatores a seu favor, mas também já é uma pessoa razoavelmente conhecida. Tudo isso contribui para o seu crescimento e indica que seja um dos que irão para o segundo turno.
Qual a influência que os votos brancos e nulos terão nestas eleições aqui no Rio?
Desde a implantação da urna eletrônica, o número de votos nulos caiu drasticamente. Antes, tínhamos uma média de 22% a 23% dos votos que eram anulados. Com a urna eletrônica os índices caíram para cerca de 5% a 6%. Somando brancos e nulos temos algo em torno de 7% a 8% do total de votos. Observamos, de forma geral, que o eleitor que vota nulo, rejeita todos os políticos, acha que está tudo errado e vai com a mesma decisão em todas as perguntas. É uma pessoa que rigidamente vota nulo. Normalmente, esse tipo de eleitor não chega a mudar muito o quadro. O que preocupa é quando os números saem desse padrão. Em geral, fica nesse patamar e não chega a influenciar favoravelmente a um ou a outro candidato.
O horário eleitoral gratuito pode influenciar o eleitor na hora de votar?
Não influencia. Todas as pesquisas que fiz até hoje, relativas ao horário eleitoral gratuito, me deram rigorosamente o mesmo resultado. Assiste quem já tem candidato e o faz para torcer por ele. São 15% das pessoas que assistem ao horário eleitoral. Desses, cerca de 7% são os que assistem a todo o programa, de ponta a ponta. O restante assiste de 10 a 15 minutos. Aí você chega para esse eleitor que assiste ao programa inteiro e pergunta se ele já mudou de opinião em função do que tenha ouvido durante o horário eleitoral, só 3% declaram que sim.
Resumidamente, o horário eleitoral atinge entre 3% a 7% do eleitorado. É muito pouco. Um dos grandes mitos da eleição é dizer que pesquisa influencia o eleitor. Não influencia em nada. Infelizmente. Porque senão eu estaria rico ou eleito. A pesquisa influencia muito, sim, os políticos, os doadores de campanha e os meios de comunicação. Mas o eleitor, não. Em uma pesquisa que fizemos com 1.100 pessoas aqui no Rio, perguntamos se elas haviam lido alguma pesquisa nos últimos 30 dias, 94% disseram que não. Sobre a média de intenções de votos que os candidatos tinham nas pesquisas, 93% declararam que não sabiam. Eleitor não vota porque o candidato está na frente.
Quais as possíveis alternativas que o senhor enxerga no segundo turno, e que alianças poderíamos esperar?
Baseado nas pesquisas, e sem querer passar a impressão de que poderia estar tirando candidatos do jogo, objetivamente teríamos três possibilidades. Um deles, provavelmente seria o Eduardo Paes, já que ele tem uma dianteira bastante grande nas pesquisas. Ele pode ir com o senador Crivella, com o Gabeira ou com a Jandira, pelo que apontam as últimas pesquisas. Se for Eduardo e Crivella, teremos o seguinte quadro: os dois fazem parte da base governamental. O presidente Lula não irá se envolver, evidentemente, pois não irá criar constrangimento ao governador Cabral.
É provável que assistamos a uma espécie de liberação geral dos outros partidos. Alguns, da base do governo, poderiam apoiá-lo. Mas há muitas resistências ao nome dele nos partidos de esquerda, pelo fato de ser evangélico e ex-bispo da Igreja Universal, o que cria alguns obstáculos a um apoio formal. Se for a Jandira, acredito que os partidos de esquerda tenderiam a marchar com ela, a exemplo do PT, o PV e do PSDB. Teríamos um enfrentamento daqueles que estão mais ou menos excluídos da política estadual. Seria uma espécie de plebiscito com o governador Cabral. E, no caso do Gabeira, teríamos o mesmo plebiscito e do outro lado um candidato que não pertence à base governamental. Ele é ligado ao PSDB, é do PV, que é da base do governo, mas dentro de uma coligação que é anti-governista.
O próprio Gabeira não é partidário do presidente Lula. Isso poderia gerar um constrangimento para esses partidos que são da base em apoiá-lo formalmente. Nesse caso, acredito também que veríamos uma certa liberação por parte dos outros partidos que estiverem fora do jogo. Não está excluído que o DEM possa vir a apoiá-lo também. Agora, para parafrasear o Garrincha, primeiro é preciso combinar com o eleitor. Pelas pesquisas, notamos que o partido pode apoiar, mas o eleitor não segue as orientações partidárias ou de seus líderes. Ele vota segundo a sua própria cabeça. Não é massa de manobra. Temos uma visão muito equivocada do eleitor. Ele não é "pobrezinho", inconsciente, ou vaquinha de presépio. Estou na ponta do processo e vejo que não. O eleitor está longe de ser bobo.
Fonte: Tribuna da Imprensa