Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - O presidente Lula encaminhou ontem aos presidentes da Câmara e do Senado a minuta da reforma política preparada a quatro mãos, pelos ministros Tarso Genro, da Justiça, e José Múcio, da Coordenação Política. Não se trata de um projeto único, mas de oito projetos destinados à apreciação em separado por deputados e senadores, certamente a partir do ano que vem. Será uma reforma fatiada.
Parece inteligente a manobra de separar os diversos temas, porque um texto só determinaria debates intermináveis e, certamente, a rejeição final da matéria. Do jeito que as coisas estão colocadas, limitando-se cada votação a um tema específico, fica mais fácil aprovar alguma coisa.
O governo não tem ilusões de que suas sugestões serão acatadas integralmente. No financiamento público das campanhas, por exemplo, imagina o próprio ministro Tarso Genro que o Congresso poderá optar por uma fórmula mista, admitindo também o financiamento privado, dentro de certas condições.
A expectativa no Palácio do Planalto é de que no primeiro semestre do ano que vem possam ser votados os primeiros projetos, aqueles menos polêmicos. Por exemplo, a votação para deputado federal e deputado estadual em listas, não em candidatos. A medida visa fortalecer os partidos, poucos ficarão contra, ainda que a decisão final também possa ser mista: os partidos preparariam suas listas, mas ao eleitor seria permitido selecionar o seu preferido, invertendo a ordem dos listados.
Quanto à chamada cláusula de barreira, que segundo o projeto do governo proibirá de funcionar no Congresso partido sem o mínimo de dez deputados federais, é provável que o número seja reduzido. A proibição de coligações partidárias eleitorais tem a simpatia dos caciques partidários, como, da mesma forma, o impedimento de venda de tempo na propaganda pela televisão por parte dos pequenos partidos de aluguel.
Em suma, o processo começou, devendo os presidentes Arlindo Chinaglia, da Câmara, e Garibaldi Alves, do Senado, marcarem ainda para o corrente ano, em novembro e dezembro, audiências públicas para ampla discussão dos projetos.
O primeiro furo e o segundo gol
A Petrobras marcou mais um gol na partida disputada em torno da decisão sobre quem irá gerir a extração e comercialização do petróleo descoberto no chamado pré-sal. Enquanto ainda se discute a criação de uma nova empresa, totalmente estatal, a Petrobras conseguiu convencer o presidente Lula a estar presente, no próximo dia 2, no meio do mar, para assistir ao primeiro furo nessa camada de petróleo situada nas profundezas.
Acompanhado da ministra Dilma Rousseff e do ministro Edison Lobão, o presidente Lula se dirigirá de helicóptero à plataforma submarina situada a 150 quilômetros do litoral do Espírito Santo.
A cerimônia não significa, ao menos por enquanto, que caberá à Petrobras a gestão integral das operações no pré-sal. Tanto o presidente quanto os dois ministros referidos temem o gigantismo da empresa, mas, como não há alternativa imediata, baterão palmas quando a broca atingir a jazida profunda.
Fala-se de mais um gol marcado pela Petrobras porque, semanas atrás, a empresa tratou de encomendar no mercado internacional mais quatro plataformas submarinas, além do restante do equipamento destinado à exploração gradativa da reserva.
Sobre a transferência de votos
Com habilidade, os principais institutos de pesquisa eleitoral estão omitindo dados a respeito da sucessão presidencial. Alguns até nem realizam esse tipo de consulta, preocupados em só agradar o presidente Lula, sem criar-lhe constrangimentos em plena campanha.
Porque quando indagam dos pesquisados se votarão em Dilma Rousseff, as respostas continuam negativas, em maioria. Mas consultado a seguir se votaria no presidente Lula para mais um mandato, o cidadão comum vacila muito pouco. Mais de 60% dos consultados pronunciam-se assim. Como ainda não é hora de a questão ser colocada de público, esses números não ganham à imprensa. Mas só por milagre deixam de ser encaminhados ao Palácio do Planalto.
O presidente Lula está sendo sincero ao negar a hipótese de disputar mais um mandato. Acredita que com o tempo será capaz de transferir à ministra Dilma Rousseff parte de sua popularidade e muito de seus votos. O problema será conciliar essa decisão com as pesquisas futuras, porque não admite solução de continuidade no próximo quadriênio: o mandatário maior terá, obrigatoriamente, que continuar programas e projetos em desenvolvimento. Como?
Ministro serra elétrica
Mesmo sem quorum para qualquer deliberação, o Congresso continua funcionando como termômetro político, já que os principais líderes dos partidos não deixaram Brasília. Ontem, era grande a irritação entre oposicionistas e governistas, diante de declarações prestadas pelo ministro Mangabeira Unger em respostas às críticas da ex-ministra Marina Silva.
A senadora criticou a medida provisória 422, que para ela estimula a grilagem de terras na Amazônia, acusando o ministro do Futuro de andar na contramão, em especial quando diz que a legislação ambiental brasileira "não é para valer". Pois Mangabeira decidiu replicar, repetindo esta semana que a legislação não presta, não existe em lugar nenhum do mundo, é amplamente violada e não foi feita para valer mesmo.
O ponto de atrito entre o ministro e a ex-ministra refere-se às regras por ela estabelecidas de que nenhuma propriedade pode ter desmatada mais do que 20% de sua floresta. Ele sustenta que até 50% podem ser desmatados, coisa que mesmo para senadores governistas é um exagero, neste início de milênio. No passado podia, ou acontecia mesmo sem poder, mas no presente, em nome do futuro, não dá mais. O aquecimento global é um fato e a preservação das florestas, uma necessidade.
Fonte: Tribuna da Imprensa