Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - O preâmbulo é óbvio: deve até ser preso quem nomear a família inteira, ou quase, para cargos de confiança ou definitivos, sem concurso, no serviço público. Sob esse aspecto, aplausos para o Supremo Tribunal Federal, que acaba de proibir o nepotismo.
Agora, com todo o respeito, a decisão foi incompleta. Ou exagerada, conforme o ângulo em que se observe. Afinal, não é por ser parente que um cidadão se acha desprovido de qualidades. Ainda bem que vivemos numa república, porque se estivesse valendo a monarquia, como se comportaria a mais alta corte nacional de justiça? Não há nepotismo maior do que um rei ser sucedido pelo filho, e este pelos netos.
Mas é bom aprofundar as coisas por aqui. No serviço público não pode, na empresa privada pode? Quantas empresas foram para o vinagre porque os filhos assumiram o lugar do pai desprovido da menor capacidade para tocar o negócio? Dirão os lógicos que isso acontece com dinheiro e com propriedades particulares os que parecem certo, mas o prejuízo, num caso, vai para o tesouro nacional e, no outro, para a empresa, a começar pelo trabalhador que perderá o emprego por incapacidade dos herdeiros. Algum dia, no futuro, essa questão precisará ser enfrentada.
Tem mais. Nada mais justo do que o filho seguir os passos do pai. Existem grandes médicos, advogados, jornalistas, comerciantes, pedreiros e camelôs de grande sucesso que seguem a trajetória familiar. Convivem com a profissão desde criancinhas, aprendem por osmose. O que dizer, no entanto, de juízes cujos filhos são advogados e tem seus escritórios inundados de clientes com causas pendentes da decisão do pai? Coincidência ou nepotismo? Se for para levar adiante a profilática súmula vinculante do Supremo, falta muita coisa a examinar.
Em defesa da saúde
À medida que o tempo passa mais atual fica a carta que Getúlio Vargas deixou antes de dar um tiro no peito. Aconteceu há 54 anos, mas seu conteúdo revela fantástica oportunidade. Quem quiser que busque recordar a carta nos livros de História. Apresentá-la neste espaço só fará aumentar nossa indignação - coisa prejudicial à saúde.
Mais do que um lamento, foi uma sentença condenatória. O irônico é que depois de Getúlio Vargas nenhum presidente da República aprendeu a lição do morto. Todos o reverenciaram, alguns até pretenderam comparar-se a ele. Inutilmente, diga-se. Sem falar nos que se esforçaram para destruir sua obra e renegar seus propósitos.
Só em novembro
Com duas ou três exceções haverá segundo turno nas eleições para prefeito nas capitais dos estados. Isso joga para a última semana de outubro a expectativa dos principais partidos políticos, porque apenas depois de conhecidos os resultados é que as cartas serão postas na mesa da sucessão de 2010.
Saindo o PT vitorioso em cidades como São Paulo, Porto Alegre, Recife e outras, ficará reforçada a candidatura de Dilma Rousseff. Caso contrário ganhará força à proposta hoje inviável do terceiro mandato para o presidente Lula. Vencendo o PMDB em boa parte das capitais, ficará difícil evitar que o partido indique o candidato a vice-presidente. Dilma, se eleita, precisará de base parlamentar bem mais sólida do que a do Lula.
O chamado bloquinho de pequenos partidos que apóiam o governo será capaz de surpreender. Candidatos do PC do B, do PSB e outros lideram as pesquisas atuais. Ganhando em Porto Alegre, Belo Horizonte, Rio, Recife e outras capitais, vão dar trabalho na hora da armação sucessória.
E se as oposições fizerem boa performance, reforçarão as chances de José Serra, mas a prefeitura de São Paulo é o coringa nesse jogo. A eleição de Marta Suplicy prejudicaria o governador, menos pelos votos do PT, mais pelo que terá sido, então, uma razoável trapalhada envolvendo Gilberto Kassab e Geraldo Alckmin. Em suma, apenas em novembro o quadro ficará claro.
Este ano não passa
Cresce no governo a chamada tendência do refluxo, quer dizer, depois de o próprio presidente Lula haver aprovado o envio ao Congresso, este ano, de propostas sobre a reforma política, é possível que nada aconteça. Os ministros da Coordenação Política e da Justiça são favoráveis ao encaminhamento imediato do projeto, mas no palácio do Planalto os ministros da casa ponderam com uma realidade inevitável: deputados e senadores não votarão a matéria, este ano.
Sendo assim, não seria preferível que o governo deixasse amadurecer mais a questão? Por que não estender a discussão para a sociedade civil, abrindo debates em associações de classe e instituições de peso? Ano que vem, então, o projeto seguiria, já com novas mesas dirigindo os trabalhos na Câmara e no Senado, coisa capaz de impulsionar mais a votação. Como réplica, existe o argumento de que 2009 antecede 2010, ano de eleições gerais, fator capaz de levar deputados e senadores a mudar o menos possível as regras eleitorais e partidárias. Afinal, quase todos disputarão no mínimo a reeleição...
Fonte: Tribuna da Imprensa