Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - Frustrou-se quem quis, com o fracasso da recente reunião da Organização Mundial do Comércio. Estava mais do que óbvio o colapso da tal "rodada de Doha" porque cada uma das nações presentes pretendia que as demais cedessem às suas exigências, mas ela, nenhuma dos outros. Tem sido sempre assim, ou melhor, quando um bissexto acordo consegue sucesso no plenário da OMC, deixa de ser cumprido por pelo menos uma das partes interessadas.
Foi o caso do algodão, que os Estados Unidos, mesmo com decisão que obrigava retirar parte dos subsídios concedidos a seus produtores, deu de ombros e continua subsidiando por inteiro.
Fazer o que, o Brasil? Primeiro, abandonar a postura de congregado Mariano que acredita em milagres e imagina bonzinhos os interlocutores. Assim comportou-se o governo brasileiro, acreditando que Estados Unidos e União Européia, de um lado, e Índia, China e Argentina, de outro, cederiam às nossas necessidades. Ética inexiste nas relações internacionais. Cada governo defende não apenas seus interesses, mas, quando pode, também a oportunidade de ampliar vantagens sobre os mais fracos.
Não se trata de declarar guerra ao mundo, porque perderíamos. Mas retaliar é preciso. Se o Hemisfério Norte recusa-se a abrir mão do auxílio dado aos seus produtos agrícolas para superar os nossos no mercado, por que não adotarmos mecanismos semelhantes?
Ainda agora o Banco Central informou que 18 bilhões e 99 milhões de dólares voaram para o exterior, só no primeiro semestre, a título de remessa de lucros das empresas estrangeiras aqui estabelecidas. Que tal taxar parte desse dinheiro? Exportamos ferro e outros minerais a preço de banana podre. Vamos aumentar o preço? O que dizer do nióbio, do qual somos a maior e quase única reserva mundial, saindo de Roraima e do Amazonas como se fosse areia? Que tal erigir barreiras às bugigangas chinesas que matam nossa indústria similar?
Acresce ser singular a globalização que o mundo rico nos impõe. Só funciona em favor deles. Contra, de jeito nenhum. Melhor exemplo não há do que a China, candidata a integrar o clube do andar de cima. Da vitória da revolução, em 1949, até a década de oitenta, aquele país apoiou-se nas próprias forças.
Não admitia conversa com investidores, exploradores e similares. Quando sentiram-se suficientemente fortes, os chineses abriram suas portas à economia mundial. Só que impondo suas condições e vencendo a grande maioria dos entreveros. Dizem ao resto do mundo: "Se não quiserem, podem ir embora ou nem deveriam ter entrado". Pois não é que entraram e continuam querendo permanecer?...
Que esbulho é esse?
Vale passar do plano internacional para a situação interna. O Copom aumentou mais uma vez os juros, a taxa agora é de 17%, forma alegada para impedir a inflação. Verdade? Absolutamente não. Mentira olímpica. Porque a média dos juros, no mundo dos negócios, é de 49,1% ao ano, claro que com os custos financeiros repassados para os produtos e para os consumidores. Muito pior fica no relacionamento direto do cidadão com os bancos. O cheque especial exige juros de 159%, os cartões de crédito mais ainda.
Trata-se do paraíso dos especuladores, o Natal permanente do sistema financeiro. O cidadão comum que se vire, implacavelmente cobrado na hora de pagar impostos.
Lula e Serra
É certo que o presidente Lula não fez com José Serra, no fim da tarde de quarta-feira, aquilo que Café Filho fez com Juscelino Kubitschek, em 1955. Adversário do então presidente da República, o governador de Minas procurou-o para tratar da crise que assolava a produção de café em seu estado. Estava disposto a não tratar de política, já que era candidato da oposição à presidência, contando com a rejeição de Café.
Surpreendeu-se o governador ao entrar no gabinete presidencial, no palácio do Catete, e receber do titular as maiores loas e rapapés. Em dado momento, Café levantou-se da cadeira a que tinha direito, pegou Juscelino pelo braço e convidou: "Sente-se aqui no meu lugar, você é candidato." Meio sem jeito, o visitante sentou. Foi quando Café, transfigurado, dedo em riste, completou: "Agora levante-se, sabendo que esta foi a primeira e a última vez que você ocupou a cadeira presidencial! Os militares não admitem a sua eleição!"
Juscelino, até morrer, contava essa história com muita graça, dizendo que deixou o gabinete de Café sem despedir-se nem ter resolvido o problema que pretendia. Desceu as escadas até o andar térreo, onde funcionava a sala de imprensa e foi cercado pelos repórteres, que desconheciam o episódio de minutos antes.
Um jornalista indagou como havia sido resolvido o problema do café e JK não perdeu a oportunidade: "De que café você está falando, meu filho? Do vegetal ou do animal?" As relações entre Lula e Serra são protocolares, enfrentaram-se nas urnas, poderão enfrentar-se de novo caso vingue a tese do terceiro mandato. Mas tanto por educação quanto por cautela, Lula jamais convidaria o adversário para sentar-se em sua cadeira.
Lula e Dilma
Em Salvador, o governador Jacques Wagner ofereceu jantar ao presidente Lula e sua comitiva. Estavam todos na ante-sala, para os aperitivos, mas não podiam passar à mesa porque faltava ela. Dilma Rousseff, é claro, que chegou com alguns minutos de atraso, sorridente, e foi saudada pelo presidente: "Vamos tratar bem a nossa candidata".
Não terá sido de caso pensado que a chefe da Casa Civil atrasou-se, muito menos para fazer a entrada triunfal no salão, mas como coincidências parecem raras em política, corre a versão de que o Lula programou tudo, só para ter a oportunidade de saudar a candidata como tal. Foi à primeira vez, e não de graça na presença de Jacques Wagner, um dos líderes do PT que ainda não absorveu totalmente a hipótese de Dilma vir a ser a candidata.
No Vaticano, a metade. Aqui, um terço...
A história foi contada por Joelmir Betting, mas merecer registro. Diante do excesso de pessoal no Vaticano, e das respectivas despesas, um jornalista mais irreverente perguntou a Sua Santidade quantos, na verdade, eram os funcionário que trabalhavam na cidade-estado. Depois de um minuto de meditação, a resposta: "A metade..."
Aqui no Brasil, se o presidente Lula vier a ser perguntado a respeito do número de funcionários públicos, certamente responderá: "Um terço..."
Fonte: Tribuna da Imprensa