Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - E ontem? Ontem, sexta-feira, dia de trabalho após um feriado, o Congresso não trabalhou. Pelo menos, não houve quórum para qualquer votação, na Câmara e no Senado. Nem para que se reunissem as comissões técnicas. Poucos parlamentares passaram pelos respectivos plenários. Como ninguém é de ferro, o funcionalismo das duas casas também se escafedeu, em boa parte.
Nos tribunais superiores, a mesma coisa. Desde quarta-feira que não se julga nada. Coisa parecida aconteceu na Esplanada dos Ministérios. Os ministros com residência fora de Brasília voaram para seus estados. Os daqui, em grande parte, aproveitaram para passear longe da capital federal. País rico é assim mesmo. Além do farto número de feriados, é praxe enforcar o dia subseqüente ou o dia anterior, conforme se situe diante do fim de semana.
Em termos de funcionalismo público, é claro, porque, nas demais atividades, trabalharam. Um ou outro empresário viajou para o exterior, alguns ficaram na casa de praia ou na casa de campo, mas a imensa maioria enfrentou o batente.
Todo esse preâmbulo se faz para uma constatação maior: o Brasil real é um, o Brasil formal, outro bem diferente. O problema localiza-se na dependência da população que trabalha frente à elite que folga. São estes que legislam, executam e julgam. Montesquieu precisa ser revisto, porque cada vez menos o Estado se distancia do Legislativo, do Executivo e do Judiciário.
Porque o Estado é a nação politicamente organizada, quer dizer, nós também, do lado real, fazemos parte dele, ainda que desamparados todas as sextas-feiras seguintes a um feriado. O poder popular precisa ser institucionalizado, como os três clássicos poderes. Uma de suas primeiras iniciativas seria estabelecer que todo mundo tem que trabalhar, em dia de trabalho...
Guerra à impunidade
Insiste o senador Pedro Simon em que o maior entrave ao desenvolvimento nacional é a impunidade. Praticam-se horrores, todos os dias, mas só os ladrões de galinha vão parar na cadeia. O tal pacote de segurança nacional aprovado no Senado e agora debatido na Câmara pode constituir um bom começo, mas, sem ampla revisão do Código Penal e do Código de Processo Penal, nada feito. Não se trata de transformar o País numa imensa penitenciária, mas de chamar às falas quantos se envolvem com o crime. Tanto faz se for o crime hediondo, violento, ou o crime enrustido, da corrupção.
O senador gaúcho insiste, não desiste. Na próxima semana fará, da tribuna, novo apelo ao Congresso para não deixar escoar mais um ano sem a aprovação de drásticas iniciativas. Apesar das dificuldades, estamos aparelhados para combater o crime na medida em que o Ministério Público, a Polícia Federal e as polícias estaduais cumprem suas obrigações. O diabo é quando os processos ganham o Judiciário. Não por culpa dos juízes, mas pela fragilidade da lei, mais preocupada em criar montes de artifícios e recursos beneficiando o criminoso.
Quem sabe, indaga Pedro Simon, meio em tom de malícia, o ministro Tarso Dutra, da Justiça, não se empenhe numa campanha contra a impunidade? Olhem que com isso poderia, teoricamente, ultrapassar a ministra Dilma Rousseff nas pesquisas sobre o futuro...
Curto-circuito
A demissão abrupta da ministra Marina Silva, a pedido, desarticulou parte da estratégia em gestação no Palácio do Planalto, que previa para julho sensível reforma no ministério, quando da desincompatibilização dos ministros candidatos nas eleições municipais. Dirão os obstinados da objetividade que seriam apenas dois, Marta Suplicy, do Turismo, e Luiz Marinho, da Previdência Social, disputando as prefeituras de São Paulo e de São Bernardo.
Pode ser assim, mas não é bem assim, porque a oportunidade ensejaria ao presidente Lula retificações paralelas, dando até a ministros com bilhete azul na mão a possibilidade de pensar em alguma prefeitura de importância, como alternativa ou como desculpa.
Marina Silva, apesar de senadora, jamais candidata à prefeitura de Rio Branco, seria então dispensada com toda pompa e circunstância. Como saiu antes, e atirando, prejudicou os planos do presidente Lula. Agora, depois da entrada de Carlos Minc, é possível que novos ministros, este ano, só mesmo os do Turismo e da Previdência Social. Ficou para o ano que vem a tão propalada formação do ministério dos sonhos, capaz de ir até o final do atual período presidencial, e de permanecer, no caso do terceiro mandato. Deu curto-circuito.
Coincidências
Há quem imagine não ter sido por mera coincidência que os Estados Unidos criaram a sua Quarta Frota da Marinha de Guerra, destinada a atuar no Atlântico Sul com dois porta-aviões nucleares e montes de navios e submarinos. A decisão veio logo depois do anúncio, pelo Brasil, da descoberta de reservas imensuráveis de petróleo, maiores que as da Arábia Saudita. Essa riqueza situa-se debaixo da plataforma submarina e até lá no fundo, em alto-mar.
A ninguém será dado duvidar de que os americanos, faz muito, entenderam dominar direta ou indiretamente todas as maiores províncias petrolíferas do planeta. Trata-se de controle ligado à própria sobrevivência dos Estados Unidos, explicando-se por isso as invasões do Afeganistão e do Iraque, assim como os pretextos que, não demora muito, embasarão igual ação bélica contra o Irã.
No nosso caso, da bacia de Santos e extensões, é claro que não se supõe a Quarta Frota acionando seus aviões, mísseis, torpedos, fuzileiros navais e sucedâneos. O domínio das reservas recém-descobertas pode ser conseguido por via econômica. Afinal, a Petrobras já é quase estrangeira. Mesmo assim, apenas para o caso de surpresas, os habitantes da imensa costa que vai do Amapá ao Rio Grande do Sul devem preparar-se para ver navios. Muitos navios...
Fonte: Tribuna da Imprensa