Por: Carlos Chgas
BRASÍLIA - Fica para outro dia a discussão sobre as novas características da sociedade moderna, a evolução de valores sociais, a tolerância absoluta e outros temas à disposição dos sociólogos. Vale descer à terra dos cidadãos comuns, felizmente em grande maioria.
Há que perguntar: por que são registradas trinta mil páginas de pedofilia explícita, constantes de três mil álbuns exibidos em milhares de computadores pelo Orkut, hospedada pelo Google? Porque essas empresas colocam o faturamento acima da moral e dos valores indispensáveis ao progresso da Humanidade - nem haverá que duvidar. São tão responsáveis, a Google e o Orkut, quanto os abomináveis tarados especializados em aliciar, explorar e degradar crianças, expondo-as e filmando-as em situações que nem Al Capone admitiria como objeto das ações de sua quadrilha.
Até aqui, é o óbvio, mas tem mais a merecer cuidados e iniciativas. Se essa indústria do horror progride tanto a ponto de proporcionar altos lucros a seus artífices e associados, por que será?
Porque existe, do outro lado dos vídeos privados, gente em número suficiente para deleitar-se com o crime à disposição de um digitar de teclas. É sobre essa multidão que também deveriam voltar-se as atenções do poder público. Quem aciona o teclado do computador para assistir cenas assim degradante é tão criminoso quanto os que preparam o espetáculo.
Aqui entra a tolerância do Estado e a presença de normas jurídicas impotentes para dar fim a esse escândalo. Acontece com o voyeur o mesmo que com o viciado em drogas. São tidos, no máximo, como doentes, coitados a merecer cuidados especiais em clínicas e hospitais insuficientes para abrigá-los. Ora bolas, o narcotráfico e os traficantes não existiriam sem os consumidores, tão culpados quanto aqueles que lhes fornecem a droga, os filmes e as fotografias de crianças seviciadas. Enquanto permanecerem imunes à lei ou até abrigados à sua sombra, os usuários em imagens de pedofilia e em cheiros, pós e injeções de variadas espécies, continuará inócua e inglória a luta contra esses execráveis tipos de crimes.
Não vamos chegar ao exagero da criação de um Grande Irmão encarregado de vigiar e invadir a privacidade da sociedade inteira, mas é preciso penalizar também os usuários. Não parece fácil identificá-los, mas se o formidável avanço da tecnologia serve para impulsionar o crime, por que não servirá para aprimorar os mecanismos de combatê-lo? Toneladas de cocaína e sucedâneos sobem e descem os morros, vendidos quando começa o asfalto e até entregues em domicílio, através de portadores, pombos-correio de shorts e sandálias, até de terno e gravata, quando não pelo Correio.
O consumidor da pedofilia não precisa de intermediários, torna-se mais difícil identificá-lo, mas nem por isso tratar-se-á de missão impossível. Entre tantos mestres e doutores da ciência cibernética não faltarão cérebros capazes de encontrar meios não apenas para impedir as transmissões, mas para detectar quantos as recebem. O que não dá é para continuar as coisas como estão. Vale repetir, se não existirem consumidores, ou se eles responderem pelo consumo na barra dos tribunais, logo irão à falência e desaparecerão seus exploradores.
Confusão desnecessária
Confusão, mesmo, quem fez foi a Comissão de Constituição e Justiça do Senado, na tentativa de disciplinar a existência dos suplentes de senador. Porque segundo a proposta votada, se o titular afastar-se para exercer o cargo de ministro do Executivo, o suplente assumirá, mas se for eleito governador, presidente da República, ou se renunciar ou morrer, o suplente permanecerá em exercício apenas até a próxima eleição, mesmo municipal, que pode acontecer em um, dois ou três anos. Se o afastamento acontecer por motivo de doença, fica o suplente durante a licença, mas se for por motivo de viagem, não assume.
Em suma, montes de regrinhas, uma para cada caso, a maioria delas proposta para não contrariar os dezesseis suplentes hoje no exercício dos mandatos, ou, sequer, aqueles que sem ter recebido um único voto aguardam com ansiedade a chance de serem chamados "Senadores da República", ainda que por quinze minutos.
É complicada a questão dos suplentes, mas a solução real, aquela que mais se adaptaria à razão e à lógica, seria simplesmente a extinção de todos. Se algum senador ficar impedido temporariamente, por doença, paciência. Os eleitores de seu estado que votem em alguém com boa saúde, nas próximas eleições. Se for nomeado ministro, embaixador ou equivalente, que renuncie.
Nessa hipótese, como no caso de morte, impedimento definitivo, cassação ou renúncia, aí sim, que se realizem novas eleições, mas rapidamente, no prazo de um mês. Vale repetir, o que não dá, com todo o respeito, é assistir cidadãos que não foram submetidos ao crivo das urnas representar a Federação. Quase sempre por haverem financiado a eleição dos titulares ou por se tratar de seus filhos, primos ou parentes variados...
Evitado o pior
O Supremo Tribunal Federal evitou o pior, esta semana, ao suspender a ação da Polícia Federal e da Força Nacional de Segurança na região da Raposa-Serra do Sol, em Roraima. Estavam, as duas instituições, por ordem judicial, prontas para invadir e botar para fora, à força, milhares de plantadores de arroz que há décadas lá se instalaram, vivendo e criando empregos. Trata-se de uma região tão extensa quanto o Estado de Sergipe, anos atrás transformada em reserva indígena, para abrigar não mais do que três mil índios.
É claro que os povos indígenas merecem amplos e intermináveis reparos pelo que sofreram e ainda sofrem pelas mãos da chamada civilização. Têm direito a permanecer onde possam preservar sua cultura, seus costumes e seu modos de vida, se quiserem, porque a maioria deles quer mesmo televisão e computador. Mas o poder público exagerou, talvez por sentimento de culpa, nos tempos do governo Fernando Collor. Reservas menores e até separadas, pois são múltiplas as etnias locais, quem sabe teriam resolvido a questão.
O diabo é que a situação prestou-se a explorações variadas, em especial por ONGs estrangeiras, financiadas por multinacionais empenhadas em transformar aquelas tribos indígenas, sob a guarda da soberania brasileira, em nações independentes. Logo algum organismo internacional sério ou fajuto as reconheceria e uma dessas grandes potências do Hemisfério Norte se encarregaria de "protegê-las", ou seja, de explorar suas riquezas minerais.
Suspender a expulsão dos plantadores de arroz não é solução, o problema continua, até pelo estímulo das ONGs dos índios, para que tomem pela força aquilo que o governo lhes prometeu. A hora seria de bom senso, sem precipitações. Mas já que falamos em expulsões, que tal botar para fora do território nacional quantos estrangeiros lá se encontram incentivando o conflito?
Fonte: Tribuna da Imprensa