ODILON OLIVEIRA prendeu 114 traficantes e está jurado de morte. Para se proteger, passou meses dormindo no fórum e há três anos não sai de casa
MÁRIO SIMAS FILHO
Odilon de Oliveira, 58 anos, jamais subiu os morros do Rio de Janeiro nem sabe manusear armas de grosso calibre. Mesmo assim, é o inimigo número 1 dos traficantes de drogas do Brasil. Para enfrentar aqueles que, segundo ele, são os “seres mais danosos” da sociedade, Oliveira faz do Código Penal uma bazuca e de sua caneta esferográfica uma metralhadora. Odilon de Oliveira é juiz federal em Mato Grosso do Sul e está sob sua jurisdição tudo o que ocorre em Ponta Porã, na fronteira com o Paraguai, porta de entrada de 70% da maconha e de boa parte da cocaína consumida no País. Oliveira assumiu essa trincheira avançada em maio de 2004 e até julho de 2005 condenou 114 traficantes a penas que, somadas, chegam a 920 anos de cadeia. Desmantelou quadrilhas especializadas em lavagem de dinheiro, requereu a extradição de mais de 50 brasileiros presos no Paraguai, tirou dos criminosos mais de 30 mansões – uma delas avaliada em R$ 58 milhões –, 14 aviões, dezenas de automóveis de luxo, apartamentos e 12 fazendas que, juntas, formam 12,8 mil hectares, além de uma série de outros bens, todos obtidos com o dinheiro das drogas. “Para vencer a guerra contra o tráfico precisamos quebrar o braço financeiro dos traficantes”, receita o juiz. “Só assim poderemos assegurar às futuras gerações que o crime não compensa”, explica. Nessa cruzada contra o tráfico, Oliveira promoveu muitas baixas nas fileiras inimigas, mas também está mutilado: teve arrancada de si a própria liberdade.
Ameaçado de morte, há três anos o juiz não freqüenta restaurantes nem vai a cinemas. Em sua casa moram, além da mulher e dos dois filhos já maiores, nove agentes da Polícia Federal que lhe garantem segurança 24 horas por dia. Até para fazer caminhadas, nas poucas horas de lazer, usa as dependências de uma unidade militar em Campo Grande, e sempre cercado pelos seguranças. “Estou preso como os traficantes, a única diferença é que as chaves de minha prisão estão comigo”, afirma Oliveira. “Mas não posso deixar o crime prevalecer em troca de dormir tranqüilo e andar sem segurança.” Ainda em 2004, logo que iniciou sua batalha contra o tráfico, Oliveira recebeu da Polícia Federal informações de que sua vida estava correndo riscos. O crime organizado estaria disposto a pagar até US$ 100 mil por seu assassinato. Em 26 de junho, uma notícia publicada no jornal paraguaio La Nación informava que a cotação do juiz no mercado dos crimes por encomenda havia subido para US$ 300 mil. “Estou valorizado”, brincou Oliveira ao ler a notícia.
As ameaças fizeram com quem a liberdade de Oliveira fosse apenas um conceito teórico. O juiz está mesmo preso. Logo depois de publicada a notícia no diário paraguaio, Oliveira deixou sua casa em Ponta Porã e foi morar em um quartel do Exército. Uma providência que o afastou da família e que não se mostrou eficaz. Na madrugada de 4 de dezembro, um homem armado tentou invadir o quartel. Houve troca de tiros e Oliveira mais uma vez mudou de endereço. Instalou seu bunker no próprio fórum da cidade, onde passou a dormir e trabalhar ainda com maior rigor. No armário da sala de despachos colocou colchonete, roupas de cama e objetos de uso pessoal. A sala de audiências foi transformada em dormitório para os seguranças e a briga contra o tráfico continuou. Em julho de 2005, por decisão do Conselho da Justiça Federal da Terceira Região (TRF-3), Oliveira foi obrigado a deixar Ponta Porã e passou a viver em Campo Grande. Apesar da determinação superior, o juiz resistiu e conseguiu mudar apenas de endereço, pois permanece à frente dos processos da fronteira. Na ocasião, escreveu ao TRF-3: “Se a Justiça proceder com fuga toda vez que um juiz sofrer tentativa de intimidação, o narcotráfico e o crime organizado ganharão força e o Judiciário cairá em descrédito perante a opinião pública”.
BUNKER Oliveira dormindo no fórum de Ponta Porã
Morar em Campo Grande não trouxe de volta a liberdade de Oliveira. Ele permanece com escolta 24 horas por dia. Os agentes da Polícia Federal que lhe dão segurança moram em sua própria casa. “Minha rotina é a de uma prisão”, explica o juiz. “Acordo e tomo café já com os seguranças ao meu redor. Saio de casa e vou para o fórum cercado pelos seguranças. Saio do trabalho e volto para casa, sempre escoltado. Não freqüento restaurantes e até para ir ao barbeiro vou com os seguranças”, diz. Oliveira e a mulher gostam de fazer caminhadas e até para isso ele precisa recorrer a esquemas especiais. Só caminha em uma instalação militar cujo nome prefere manter em sigilo, e ainda assim cercado pelos agentes da PF. “Em Campo Grande a situação de risco persiste. Nada mudou”, constata o juiz já acostumado a receber cartas e telefonemas anônimos ameaçadores. Mas, na guerra contra o tráfico, na capital do Estado Oliveira encontrou o recuo suficiente para elaborar novas táticas, sempre com o propósito de “quebrar o braço financeiro” dos criminosos.
Nos próximos dias Oliveira fará um novo ataque. Ele já solicitou a avaliação dos bens dos dez últimos traficantes que prendeu. Depois disso, planeja determinar o leilão desses bens, antes mesmo da condenação final dos presos. O dinheiro arrecadado, segundo o juiz, ficará depositado em uma conta bancária em nome da Justiça Federal e não poderá ser usado até que o processo criminal se encerre. “Se em última instância o sujeito for absolvido, terá direito a todo o dinheiro, com os juros do período. Se for condenado, o dinheiro já ficará imediatamente à disposição do Estado”, diz Oliveira. Dessa maneira, sustenta o juiz, sem acesso ao patrimônio obtido com dinheiro ilegal, esses criminosos não terão como comprar testemunhas e até corromper autoridades.
As ameaças fizeram com quem a liberdade de Oliveira fosse apenas um conceito teórico. O juiz está mesmo preso. Logo depois de publicada a notícia no diário paraguaio, Oliveira deixou sua casa em Ponta Porã e foi morar em um quartel do Exército. Uma providência que o afastou da família e que não se mostrou eficaz. Na madrugada de 4 de dezembro, um homem armado tentou invadir o quartel. Houve troca de tiros e Oliveira mais uma vez mudou de endereço. Instalou seu bunker no próprio fórum da cidade, onde passou a dormir e trabalhar ainda com maior rigor. No armário da sala de despachos colocou colchonete, roupas de cama e objetos de uso pessoal. A sala de audiências foi transformada em dormitório para os seguranças e a briga contra o tráfico continuou. Em julho de 2005, por decisão do Conselho da Justiça Federal da Terceira Região (TRF-3), Oliveira foi obrigado a deixar Ponta Porã e passou a viver em Campo Grande. Apesar da determinação superior, o juiz resistiu e conseguiu mudar apenas de endereço, pois permanece à frente dos processos da fronteira. Na ocasião, escreveu ao TRF-3: “Se a Justiça proceder com fuga toda vez que um juiz sofrer tentativa de intimidação, o narcotráfico e o crime organizado ganharão força e o Judiciário cairá em descrédito perante a opinião pública”.
BUNKER Oliveira dormindo no fórum de Ponta Porã
Morar em Campo Grande não trouxe de volta a liberdade de Oliveira. Ele permanece com escolta 24 horas por dia. Os agentes da Polícia Federal que lhe dão segurança moram em sua própria casa. “Minha rotina é a de uma prisão”, explica o juiz. “Acordo e tomo café já com os seguranças ao meu redor. Saio de casa e vou para o fórum cercado pelos seguranças. Saio do trabalho e volto para casa, sempre escoltado. Não freqüento restaurantes e até para ir ao barbeiro vou com os seguranças”, diz. Oliveira e a mulher gostam de fazer caminhadas e até para isso ele precisa recorrer a esquemas especiais. Só caminha em uma instalação militar cujo nome prefere manter em sigilo, e ainda assim cercado pelos agentes da PF. “Em Campo Grande a situação de risco persiste. Nada mudou”, constata o juiz já acostumado a receber cartas e telefonemas anônimos ameaçadores. Mas, na guerra contra o tráfico, na capital do Estado Oliveira encontrou o recuo suficiente para elaborar novas táticas, sempre com o propósito de “quebrar o braço financeiro” dos criminosos.
Nos próximos dias Oliveira fará um novo ataque. Ele já solicitou a avaliação dos bens dos dez últimos traficantes que prendeu. Depois disso, planeja determinar o leilão desses bens, antes mesmo da condenação final dos presos. O dinheiro arrecadado, segundo o juiz, ficará depositado em uma conta bancária em nome da Justiça Federal e não poderá ser usado até que o processo criminal se encerre. “Se em última instância o sujeito for absolvido, terá direito a todo o dinheiro, com os juros do período. Se for condenado, o dinheiro já ficará imediatamente à disposição do Estado”, diz Oliveira. Dessa maneira, sustenta o juiz, sem acesso ao patrimônio obtido com dinheiro ilegal, esses criminosos não terão como comprar testemunhas e até corromper autoridades.
Fonte: ISTOÉ