Os programas de distribuição de renda do governo federal não estão funcionando como deveriam. Esta é a conclusão óbvia que se tira da situação radiografada nas ruas pelo repórter Marcelo Migliaccio, exposta ontem pelo JB. Apesar de o guarda-chuva assistencial da União estender-se sobre 2,3 milhões de pessoas no Estado do Rio, com repasse anual de R$ 1,2 bilhão, virou rotina encontrar jovens e crianças perambulando pela Zona Sul da capital, em busca de esmolas.
O mais triste é constatar que boa parte dessas crianças e adolescentes recebe algum tipo de benefício do governo. O caso da desempregada Elizângela Santos Silva é lapidar. Moradora de Costa Barros, mantém os três filhos matriculados numa escola da Zona Norte para garantir os R$ 112 mensais do Bolsa Família. O que não impede que, nos fins de semana, rume com a família para Copacabana. Limpa pára-brisas em troca de moedas. Dormindo na calçada, reforça o orçamento familiar em R$ 60. E, indiretamente, confirma que, da forma em que está, o modelo do Bolsa Família distribui dinheiro, mas incentiva a pobreza, em vez de promover a educação.
A pioneira na implantação do programa foi Brasília. Idealizado e implementado pelo ex-governador do Distrito Federal Cristovam Buarque (1995-1998), o então chamado Bolsa Escola assegurava um salário mínimo a cada família carente que tivesse todas as crianças entre 7 e 14 anos matriculadas na escola pública. Encampado pelo governo Fernando Henrique Cardoso em abril de 2001 (com a designação de Programa Nacional de Renda Mínima vinculada à Educação - Bolsa Escola), ganhou dimensão nacional. Tropeçou no gigantismo e, depois de assumido pelo governo Lula (rebatizado de Bolsa Família), mais se compara ao assistencalismo populista.
No Estado do Rio, quase 490 mil famílias com renda mensal inferior a R$ 120 são beneficiárias do programa - que entrega R$ 50 fixos mais R$ 18 por filho. A contrapartida seria a obrigatoriedade de manter as crianças na escola. Mas aí está o maior problema: não há controle. É ínfima a porcentagem das instituições de ensino que informam ao governo a freqüência dos alunos. Se os filhos vão ao não às aulas, pouco importa. No fim do mês, os pais continuarão a receber a quantia.
No princípio, o programa visava estimular o jovem a estudar e, assim, subir na escala social. À época, a mãe raciocinava que só teria direito ao benefício se o filho tivesse bom desempenho na escola. Hoje, ela faz o que pode para se manter na pobreza porque teme, no caso de se empregar, perder o benefício. Prefere manter-se atrelada ao assistencialismo oficial.
Raros são os beneficiários que conseguem romper esta ciranda de miséria e pedir exclusão do programa. Ao contrário, cresce a cada ano a legião de assistidos - o que, para o governo, pode até ser positivo pelo lado eleitoral, mas é extremamente negativo para a nação.
Fiscalizar a contrapartida exigida por lei é fundamental para retomar o bem intencionado caminho proposto pelos autores do programa. Assegurar um ensino de qualidade é tão essencial quanto a primeira premissa. E a fim de resgatar os jovens das ruas ou os pais do mercado informal, cursos profissionalizantes e de requalificação de mão-de-obra são prioritários. Só assim se conseguirá, algum dia no futuro, liberar toda uma geração condenada ao assistencialismo.
Fonte: JB Online