Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - Assistimos, semana passada, a um verdadeiro desfile de ministros e altas figuras do PT criticando duramente a proposta do terceiro mandato. Parece até coisa encomendada, porque Guido Mantega, Paulo Bernardo, Luiz Dulci, Dilma Rousseff, Marco Aurélio Garcia, Tarso Genro, Tião Viana, Arlindo Chinaglia e outros personagens da intimidade do presidente Lula, ordenadamente, repudiaram a hipótese de ser aprovada emenda permitindo ao chefe do governo disputar mais um mandato no exercício de suas funções.
Não há argumento para questionar a sinceridade deles, ou até para duvidar de que assim se tenham pronunciado por inspiração do presidente Lula. Agora, com todo o respeito, há o reverso da medalha. Porque sem o terceiro mandato, isto é, sem Lula disputando as eleições, condena-se o PT a perder o poder, já que falta ao partido um candidato em condições de vitória. Menos ele.
Assim, as perguntas surgem: admitiria Guido Mantega deixar o todo-poderoso comando da política econômica para aceitar dar aulas de economia numa universidade qualquer? Paulo Bernardo, do Planejamento, recomeçaria do zero sua carreira política, sabendo que perdeu faz muito as chances de se eleger deputado federal? Luiz Dulci, secretário-geral da presidência, abdicaria da condição de estrategista maior da política palaciana para voltar a dar aulas de latim e português num cursinho de vestibular?
Dilma Roysseff, de chefe da Casa Civil e primeira-ministra informal do governo, retornaria à vida sindical no Rio Grande do Sul? Marco Aurélio Garcia conseguiria tornar-se consultor para assuntos de política externa? Pois é. Hoje, eles e outros se mostram contrários ao terceiro mandato, mas, à medida que 2010 se aproximar, resistirão à tentação de manter o poder a importância que seus cargos ensejam?
Confidência
Quando manobrava os cordéis para arrancar do Congresso a possibilidade de reeleger-se, o presidente Fernando Henrique abriu o coração para dois amigos que vieram de São Paulo para visitá-lo em Brasília: Roberto Gusmão e Fernando Pedreira. Depois de mostrar as dependências do Palácio da Alvorada, inclusive seus aposentos pessoais, o presidente comentou que sua vida era um paraíso. Tudo de que necessitava acontecia sem que se mexesse gastando energia.
Até mesmo, de manhã, era o mordomo que escolhia e separava o terno que vestiria, combinando com a cor da camisa, a gravata, as meias e o sapato. Para as refeições, guloso como era, havia até uma chefe de cozinha perfeita, brindando a família com os pratos mais apetitosos. "Acham que vou abrir mão disso assim tão facilmente?" - perguntou com um misto de ironia, humor e determinação.
Acrescentou que era muito bom ser presidente. Não abriu. Reelegeu-se e viveu mais quatro anos naquele Nirvana tropical. E o presidente Lula não será tentado a sonhar o mesmo sonho? Qualquer dia começará a pensar nas dificuldades de freqüentar aeroportos e enfrentar apagões aéreos. Quando tiver vontade de tomar um uísque, se D. Marisa não estiver por perto, necessitará ir à geladeira para pegar gelo.
No caótico trânsito de São Paulo, mesmo com direito a carro com motorista, como todo ex-presidente, poderá ser surpreendido falando mal dos engarrafamentos e lembrando-se de quando via tudo de cima, deslocando-se de helicóptero. É claro que esses exemplos são alegorias. O poder enseja mil outras benesses, entre outro tanto de aborrecimentos, mas, aqui para nós, o poder parece irresistível. O terceiro mandato vai dar o que pensar.
Capitais
Agitam-se os partidos, durante o recesso, para tomarem as decisões relativas às eleições municipais. A previsão é de que em fevereiro já estará esboçada a relação dos candidatos às prefeituras das capitais. Sabem todos que 2008 será o ensaio para 2010. Os partidos que conseguirem eleger prefeitos nas capitais estarão demonstrando seu potencial para as eleições de presidente. Dependerão da inclinação do eleitorado, daqui a menos de um ano, as chances para a escolha do futuro presidente.
Inclui-se na equação a hipótese do terceiro mandato para Lula: caso o PT não consiga eleger os prefeitos de São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba, Recife e outras cidades de primeiro nível, estará reforçada a previsão de que também não elegerá o futuro presidente. Nesse caso, a única tábua de salvação para os companheiros permanecerem no Planalto será o terceiro mandato. É bom prestar atenção.
FONTE: TRIBUNA DA IMPRENSA