sábado, fevereiro 10, 2007

Wagner toma pito de prefeito e passa vergonha

Governador tenta assumir obra de Paulo Souto e gestor de Feira de Santana corrige o ‘lapso’ na frente de Lula


Um governador que tenta capitalizar para um mandato que não tem nem 40 dias a instalação de indústrias conseguidas pela gestão anterior e um presidente que faz de tudo para livrar o pupilo de saias-justas foram revelados ontem a quase 500 empresários, políticos e autoridades presentes na inauguração da fábrica da Nestlé em Feira de Santana. No discurso em que procurou dar ares de epopéia a sua trajetória de sindicalista até governador (“eu já fui chão de fábrica”), Jaques Wagner não teve pudor em procurar assumir a paternidade de dois projetos que somam quase R$450 milhões em investimentos na Bahia.
“É a segunda fábrica que inauguro em apenas 39 dias de governo. Semana passada, inauguramos em Camaçari a fábrica de pneus da Bridgestone e a Bahia já é responsável pela produção de 55% dos pneus de nosso país”, comemorou, esquecendo que todo o trabalho de atração dos empresários com incentivos fiscais foi empreendido pela equipe do então governador Paulo Souto, mais de um ano antes.
A frase de Wagner foi uma tentativa de superar o mal-estar nas hostes petistas depois do pronunciamento do prefeito de Feira de Santana, José Ronaldo de Carvalho, que resolveu fazer justiça ao governo pefelista. Carvalho salientou que, nos seis anos à frente da prefeitura, o município já tinha conseguido atrair R$1,2 bilhão em investimentos para o parque industrial. Ele também não dispensou a chance de, diplomaticamente, alfinetar o lulo-petismo. “Agradeço a presença do presidente e do governador, mas agradeço muito mais ao querido amigo e ex-governador Paulo Souto, pela mão amiga estendida”, elogiou José Ronaldo, diante da mesa composta pela ministra da economia da Suíça, Doris Leuthard; o vice-presidente da Nestlé para as Américas, Paul Bulcke; o presidente da Nestlé Brasil, Ivan Zurita; além dos ministros Celso Amorim (Relações Exteriores), Waldir Pires (Defesa) e Silas Rondeau (Minas e Energia). “Ele (Souto), sim, foi o responsável pela inauguração desta fábrica – e de outras tantas que estão povoando o Pólo Industrial de Subaé”, completou José Ronaldo.
Em seguida, Carvalho cobrou do governo federal verbas para a construção do contorno rodoviário na cidade, destinado a melhorar o escoamento da produção do pólo. Jaques Wagner limitou-se a afirmar que haverá verbas para o contorno rodoviário, através de emendas parlamentares no Congresso Nacional.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não fez questão nenhuma de diminuir o tom da lira petista. Prevendo momentos de crise e desgaste para o governador da Bahia – que gosta de se apresentar como queridinho do presidente –, ele prometeu socorrê-lo com muito mais do que um ombro companheiro. “Eu sei que quando você (Wagner) tiver problemas, vai bater na minha porta, e eu, como tenho um coração um pouco baiano, estarei sempre pronto para atendê-lo”, comprometeu-se.
A mesma boa vontade em resolver as dificuldades do “companheiro Wagner”, Lula não demonstrou para a desempregada Margarida da Silva Ferreira Santos, que chegou pouco antes das 6h na portaria da 27ª fábrica da Nestlé instalada no Brasil, num terreno de 350 mil metros quadrados no Centro Industrial de Subaé, na BR-324, em Feira de Santana. A mulher de 33 anos, mãe de um garoto de 5 anos, apresentou um cartaz escrito anteontem à noite em uma cartolina rosa: “Ajude-me. Dêi-me (sic) um emprego”. “Eu sou sustentada por meu pai, de 78 anos, e minha mãe, de 64 anos, os dois sofrem do coração. Minhas irmãs até foram contra eu vir até aqui me expor, mas se eu não gritar, ninguém vai saber minha dor”, explicou Margarida, que mora no distrito de Humildes, mais próximo da fábrica do que a sede do município.
Outras manifestantes, como a lavradora Jeane dos Santos Reis, 29 anos, cinco filhos, também acordaram cedo para ir até a entrada da empresa, que emprega atualmente 200 funcionários e deve dobrar a produção nos próximos meses. “Eu tiro o alimento meu e dos filhos de uma horta, na verdade, uma leira que tem lá na roça. Preciso de um emprego e vim deixar meu currículo”, apostava Jeane, munida com uma trouxinha com água, biscoito e bago de jaca.
Na cerimônia de inauguração, na parte interna da fábrica, não faltaram os biscoitos, iogurtes, sorvetes e bombons com a marca da multinacional Suíça que produz mais de 1,3 mil itens alimentícios diferentes. O presidente da Nestlé no Brasil, Ivan Zurita, ressaltou que a fábrica irá produzir exclusivamente para o mercado do Norte-Nordeste e destacou a capacidade dos funcionários baianos.
O prefeito de Feira de Santana cobrou uma promessa feita por Lula em, setembro de 2003, na época da inauguração da fábrica da Pirelli no município. Na ocasião, diante das reivindicações do povo e dos políticos locais para a construção de um anel rodoviário na cidade para o melhor trânsito dos caminhões de carga, o presidente garantiu recursos para a obra. “Não posso deixar de aproveitar a oportunidade para, em nome do povo feirense, cobrar a duplicação de nosso contorno”, salientou José Ronaldo.Jaques Wagner, como pupilo dileto de Lula, não deixou o presidente responder à cobrança e se comprometer novamente. “Quanto ao contorno, graças à gentileza de nossa bancada federal, uma parte dos recursos está garantida”, antecipou-se o governador.
O presidente autorizou a Secretaria de Imprensa do Planalto convocar os jornalista para uma entrevista coletiva depois da inauguração. Os principais temas das perguntas seriam a anistia a José Dirceu e o racha público das principais correntes do PT. Só que Lula aproveitou a chuva para entrar no carro oficial, fugindo do interrogatório.
Fonte: Correio daBahia

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