Por: Carlos Chagas (Tribuna da Imprensa)
BRASÍLIA - "Cuidar dos pobres é fácil. Os pobres não dão trabalho, é bom governar para eles." Convenhamos, assim não dá. Escorregar, o presidente Lula escorrega há muito tempo, mas um tombo como esse preocupa. Falou o que não devia e não podia. Ainda há pouco as Nações Unidas divulgaram números arrasadores: no Brasil, 55 milhões moram em favelas. Presume-se que sejam pobres, excetuando-se a ínfima minoria dos narcotraficantes. É fácil governar para eles?
Só se for para deixá-los onde estão. Tem mais. O presidente congratulou-se com os pobres porque eles não fazem passeatas, não marcham pela Esplanada dos Ministérios nem se organizam em sindicatos. No máximo, vão à igreja. A conclusão é de que os sem-terra não são pobres. Estão organizados, coisa que preocupa o governo. Como eles, os trabalhadores sindicalizados, as associações de classe, todos transformando em dificuldade a arte de governar...
O cuidado maior de que necessitam os pobres é acabar com eles, não no sentido macabro, mas fazendo com que deixem de ser pobres. Mas as tentativas têm malogrado. Talvez porque seja melhor e mais fácil governar para eles. Não dá trabalho. Vão à igreja, consomem cestas básicas e contentam-se com o Bolsa-Família. A solução é aumentar a pobreza.
Fajutice
Nem toda publicidade governamental é fajuta, mas a grande maioria não escapa. Trata-se de dinheiro jogado fora, ou melhor, muito bem aplicado para conquistar a simpatia da mídia. Só que certas publicidades, além de fajutas, são burras. Agridem a inteligência nacional. Um exemplo: ouve-se muitas vezes ao dia o empenho do governo em recuperar as ferrovias. Até que seria aceitável, depois do criminoso desmonte iniciado há décadas. O triste, porém, é assistir à celebração bombástica na voz de locutores entusiasmados, apregoando: 27% da produção brasileira são transportados por ferrovias...
Na Europa, 81% da carga vai de trem. Nos Estados Unidos, 74%. Na China, tão exaltada, 92%. Não dá para festejar que transportamos 27%, número ridículo que deveria ser escondido. Pois é comemorado. E com o nosso dinheiro...
Falência
Roberto Rodrigues deixou para o último dia dos trabalhos parlamentares o anúncio de sua exoneração. Em termos de fidelidade ao presidente Lula, agiu bem. Seu gesto quase não repercutiu no Congresso, tendo em vista o vazio nos plenários da Câmara e do Senado. Agora, foi um escândalo a saída do ministro da Agricultura, um dos ícones do governo. Exprimiu o fracasso da política antes exaltada como um dos maiores sucessos da administração federal. Quem não se lembra da badalação feita em torno do agronegócio, nos primeiros dois anos do Lula no poder?
Havíamos multiplicado as exportações, conquistado novos mercados, recebido moeda forte aos montes, tudo através do agronegócio. E agora?
Fracassou o modelo, apesar dos esforços de Roberto Rodrigues. Os produtores rurais endividaram-se como nunca, o preço das colheitas caiu e as multinacionais escafederam-se ao primeiro sinal de crise. Também, bem feito para o governo por ter atropelado o campo e a semântica. Porque chamar de agronegócio a produção de grãos e a exportação de carne exprimiu um engodo, pois desde o descobrimento nada mudou: plantamos e mandamos o resultado para o exterior.
Qual a novidade, mesmo se agora denominada agronegócio? Agrícola já era, como negócios também se faziam a partir da chegada dos portugueses. O diabo foi perceber que o brasileiro não come soja. Só ajudou a engordar a Bolsa de Chicago, lá fora, e o lucro dos bancos, aqui dentro...
17% de quê?
Anuncia o governo estar o desemprego na faixa dos 17%. A pergunta continua: 17% de quê? Dos 180 milhões de brasileiros? Da população em condições de trabalhar? Dos que procuram emprego ou dos que recebem o salário-desemprego? Entram aí camelôs e os que se encontram na informalidade?
Ninguém responde. Preferem comemorar os anunciados, mas não comprovados, quatro milhões de empregos. É verdade que Lula não fala dos mais de quatro milhões demitidos desde que assumiu. Vamos ver como eles votam...
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