quarta-feira, maio 17, 2006

Falta coragem

Por: Carlos Chagas

BRASÍLIAA - Ninguém duvida da premissa, que é de entrar para rachar. Pau neles! Os presos e os soltos. As rebeliões em penitenciárias precisam ser debeladas horas depois de deflagradas pela invasão armada, pelo bombardeio, pela presença de tanques, helicópteros e, se necessário, pela resposta, à bala, de quantos resistirem. Os reféns? Ora, o risco é deles, mas seria bom, por um largo tempo, proibir visitas a estabelecimentos penais. Quanto aos funcionários e agentes penitenciários, que se defendam e evitem cair em poder dos bandidos. Ou não dispõem de armas? Ou não sabiam do risco, ao aceitar o emprego?
É claro que essa receita deve valer para os sentenciados irrecuperáveis, os que realmente precisam ser encarcerados e enjaulados: autores de crimes hediondos, do tipo assalto à mão armada, latrocínio, seqüestros, assassinatos de toda ordem, envolvimento com narcotráfico e contrabando de armas. Quem estiver preso por passar cheque sem fundo ou roubar um pacote de manteiga pode muito bem ser devolvido à sociedade. Se reincidir, deve ficar recluso com os outros.
Risco de desagregação nacional
Quanto aos que estão soltos, como esses animais que agora promovem o pavor em São Paulo, a solução será mobilizar os serviços policiais e militares de inteligência. Identificá-los, mesmo que demore um pouco mais, apelar para a sociedade abandonada no sentido de denunciá-los. Caçá-los.
Repetir que a solução está na educação e em investimentos sociais maciços pode se constituir na fórmula ideal, necessária, a ser buscada a médio e longo prazos. Como a questão é aguda e imediata, importa haver coragem do poder público para mobilizar todas as forças ao seu dispor.
Se as guardas e as polícias civil e militar dos municípios e dos estados mostram-se insuficientes, como se vêm mostrando, que entre a União, convocada ou não pelos governadores. Até mesmo com estado de sítio, estado de defesa ou estado de emergência. Através da Força Nacional de Segurança Pública, do Exército, da Marinha, da Aeronáutica e dos Fuzileiros Navais. Trata-se de uma guerra, e os soldados estão preparados para ela, mesmo sem treinamento para subir favelas.
Não dá é para assistir ao desdobramento do horror em São Paulo e já se alastrando por outros estados. O problema é de direitos humanos, mas não dos animais que matam nas ruas e nos presídios, senão da população e dos agentes do poder público, hoje sendo assassinados em progressão inadmissível.
Se for preciso mudar a Constituição, que se mude. Alterar os Códigos Penal e de Processo Penal? O Congresso jamais se negaria a cooperar. Convencer a Justiça e o Ministério Público da necessidade de agilizar medidas para punir os culpados e de salvar as instituições? Eles já parecem convencidos. É preciso coragem. Ou o poder público se articula e começa a agir, ou pela primeira vez desde as revoltas separatistas do Império o risco será da desagregação nacional.
Lições da Alemanhã
Depois da queda de Berlim e do fim da II Guerra Mundial, espantaram-se os alemães. A população do extinto III Reich alegava não saber de nada, em se tratando dos campos de concentração, dos assassinatos, das perseguições e da violência das tropas nazistas nos territórios ocupados.
Não foi bem assim. O povo alemão fechou os olhos àquelas barbaridades. Se não tinha conhecimento detalhado, sabia bem estarem acontecendo. Se tudo corria bem para eles, nos primeiros anos da conflagração, por que se preocupar?
Toda moeda tem duas faces. Guardadas as proporções, algo parecido com o que se passou na Alemanha acontece com boa parte dos paulistas. Para eles, a moda tornou-se só competir, enriquecer e trabalhar, sem maiores considerações para com aqueles que não conseguiam enriquecer, nem competir, muito menos trabalhar.
Frustraram-se estes, em número maior do que os vitoriosos. Naturais do Estado, assim como emigrantes dos demais estados, foram sendo segregados pela minoria fechada em suas metas. Sem emprego, entregues à própria sorte, sem que ninguém deles cuidasse, muitos encontraram seus próprios caminhos na marginalidade. São os que se lançam agora nessa animalesca demonstração de revolta. Devem ser contidos? Claro.
Mas seria bom que os paulistas de sucesso acordassem para a responsabilidade no que ocorre. Tivessem olhado mais para as agruras do semelhante e talvez não assistíssemos ao espetáculo de horror. Solidariedade é o produto mais em falta nas prateleiras do Estado mais rico.

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