Certificado Lei geral de proteção de dados

Certificado Lei geral de proteção de dados
Certificado Lei geral de proteção de dados

domingo, março 29, 2009

Prisão cautelar

Nos últimos dias assistimos a uma enxurrada de prisões. Primeiro sacia-se a sanha dos leigos que querem ver poderosos (seja quem for) atrás das grades. Logo depois, com o indefectível HC, a frustração. Aí, para não ficar a ver navios, resolvem criticar o autor do ato liberatório. No entanto, como é bem de ver, e como sabem os doutos migalheiros, banalizou-se a prisão cautelar. Quem fala melhor disso, em oportuno artigo, é o advogado Antonio Sergio A. de Moraes Pitombo, para quem a "perda de referencial quanto à técnica jurídica de aplicação da prisão cautelar é a causa direta da exacerbação de prisões, antes do trânsito em julgado das sentenças condenatórias".

Prisão cautelar e liberdade


Antonio Sergio A. de Moraes Pitombo*
Existiu um tempo em que se ensinava processo penal. Há mais de um século, o aluno de Direito aprendia que o processo criminal se vinculava ao direito constitucional e, portanto, as normas processuais tinham de ser interpretadas a contar de princípios e regras da Lei Maior (clique aqui).
O passar dos anos consumiu a simplicidade da lição. Criaram-se, assim, teorias artificiais para explicar, por exemplo, a aplicação da prisão cautelar. Trocou-se a certeza quanto à liberdade ser a regra e a prisão a exceção, pela fórmula abrangente da pretensa aplicação dos critérios de cautelaridade do perigo da demora e da fumaça do bom direito.
Antes a convicção dominante era a liberdade estar protegida pelo sistema jurídico. Logo, alguém só poderia vir a ser preso no curso da persecução penal, caso o juiz criminal fundasse a decisão cautelar em fato concreto e em razão legal de prender antecipadamente o inocente.
Hoje, ao invés de se exigir a clara motivação judicial, se aceita a vagueza da repetição de lugares comuns como ordem pública. E, os crimes tornaram-se etiqueta indicativa de gravidade social (v.g., crime hediondo) e causa autônoma da pretensa necessidade de prisão processual.
A fragilidade da doutrina facilitou a prática das arbitrariedades. Prender alguém sob o fundamento da aparência do bom direito é muito mais fácil do que descortinar o fato e encontrar previsão legal que justifique a prisão cautelar.
Portanto, não sem razão os antigos valorizavam a relação intrínseca entre processo penal e Constituição. Eles almejavam incutir na cabeça dos juízes que a prisão deve ser compreendida como exceção e, por conseqüência, necessitam, suas normas jurídicas, serem interpretadas de forma restritiva.
Ora, a perda de referencial quanto à técnica jurídica de aplicação da prisão cautelar é a causa direta da exacerbação de prisões, antes do trânsito em julgado das sentenças condenatórias. Prende-se para obter confissões no inquérito policial, por meio da prisão temporária. Prende-se para impedir o exercício da defesa, mediante a prisão preventiva. Prende-se para dar exemplos à sociedade na prisão da sentença. Prende-se para se mostrar juiz "independente e popular", graças à "coragem" de prender os ricos.
Quer dizer, sumiram os motivos legais para a decretação de prisão processual e passaram a predominar discursos políticos, argumentos psicossociais, assim como idiossincrasias de pessoas que deveriam agir, em nome do Estado, de modo imparcial e consoante a letra da lei.
Os abusos judiciais advêm da contribuição nefasta da mídia, porque os jornalistas se mostram incapazes de ver na prisão cautelar indevida a perpetração de uma violação à dignidade humana. Eles perderam a noção do humano e se regozijam com o escárnio dos presos, ricos e pobres. Não se envergonham de filmar e fotografar a prisão, nem pensam antes de propalar a suposta igualdade social de prender também os ricos. Não enrubescem ao tornar heróis, nas notícias, juízes que não cumprem a lei.
Resta a esperança naqueles que preservam a cultura do passado, pessoas impermeáveis ao discurso reacionário do nosso tempo que têm de se unir para voltar a pregar o respeito à Constituição, como alicerce para o estado de Direito.
O processo penal constitui instrumento da liberdade contra o arbítrio estatal, ensinava um falecido professor do Largo de São Francisco. Seria melhor repetir aos alunos o ensinamento tradicional a se fingir de moderno sem lhes explicar o porquê se lê no jornal de hoje a descrição de outra prisão cautelar de inocente, constitucionalmente inocente.
_______________
*Advogado do escritório Moraes Pitombo Advogados
Fonte: Migalhas

Em destaque

"Demolição do Parque de Exposição: Um Atentado à Legalidade e ao Bem Público"

. O vídeo que estou reproduzindo aborda um assunto crucial para a comunidade de Jeremoabo: o direito municipal e a alienação de bens públi...

Mais visitadas