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sábado, maio 27, 2006

O que falta não é estrutura

Por: Editorial - O Estado de São Paulo

Os críticos do Congresso apressaram-se a condenar os presidentes da Câmara e do Senado por terem terceirizado a investigação sobre o envolvimento de grande número de parlamentares no escândalo revelado pela Operação Sanguessuga, da Polícia Federal. Dezenas, se não duas centenas de deputados e pelo menos um senador estão sob suspeita de terem se acumpliciado com negociantes corruptores, prefeitos corruptos e uma assessora venal do Ministério da Saúde, para incluir no Orçamento emendas destinadas à compra de ambulâncias superfaturadas.
Documentos apreendidos pelos federais e pelo Ministério Público indicam que, entre 2000 e 2005, congressistas e ex-congressistas receberam pelo menos R$ 1,5 milhão em propinas por sua denodada participação no esquema. O deputado petebista Nilton Capixaba, de Roraima, encabeça o rol dos premiados, com R$ 437 mil. O mensaleiro Pedro Henry, do PP de Mato Grosso, afinal absolvido pela Pizzaria Plenário, teria embolsado R$ 145 mil. Até o ex-senador e ex-presidente do INSS Carlos Bezerra, do PMDB do mesmo Estado, teria tido o seu quinhão - irrisórios R$ 10 mil, menos do que a quarta parte da paga que teria beneficiado a sua mulher, a deputada Teté Bezerra.
Quando o escândalo ganhou corpo com a prisão de 44 quadrilheiros, divulgou-se que, para tirar proveito da delação premiada, a já ex-assessora da Saúde, igualmente detida, apontou como sanguessugas do Tesouro 170 deputados, ou 1 em cada 3, além do senador e líder peemedebista Ney Suassuna. Originalmente, a Polícia Federal havia dado os nomes de 62. Como era de esperar, a Câmara reagiu com viva indignação - contra a Polícia Federal, por ter vazado o rol. Também célere, o corregedor da Casa, Ciro Nogueira, do PP piauiense - que o então presidente Severino Cavalcanti queria ver entre os ministros de Lula -, descartou investigar 37 daqueles nomes, deixou 9 casos em suspenso, aceitando examinar apenas 16 acusados.
Mas nem isso se fará depois que os dirigentes do Legislativo repassaram o problema à Procuradoria-Geral da República, sob o argumento de que nem a Câmara nem o Senado têm estrutura para esclarecer tamanho número de denúncias. A verdadeira estrutura - ou melhor, estatura - que falta ao Congresso ficou patente com outra decisão correlata àquela, de responsabilidade do presidente do Senado. Ele se recusou a instalar a CPI dos Sanguessugas, de iniciativa, entre outros, dos deputados Roberto Freire e Fernando Gabeira, que recolheram mais assinaturas do que o mínimo necessário para abrir a investigação parlamentar. Freire anunciou que recorrerá ao STF.
Um dos pretextos invocados pelo corregedor Nogueira para remeter a apuração ao procurador-geral Antonio Fernando de Souza - que por sua vez acionará o STF, como fez em relação aos 40 integrantes da "sofisticada organização criminosa" do mensalão, dado o foro privilegiado a que têm direito muitos deles - é que a corregedoria não possui a faculdade de quebrar sigilos, mas a procuradoria sim. Esqueceu-se de que as CPIs também. Com a grandeza moral que a Câmara não se cansa de evidenciar, ao salvar um mensaleiro depois do outro - com o pepista Vadão Gomes, acusado de receber R$ 3,7 milhões do valerioduto e absolvido anteontem, já são 11 os agraciados -, a transferência do caso dos sanguessugas é um favor ao País.
Sintoma disso é a informação do presidente da Câmara, depois de depositar a tarefa na soleira da procuradoria-geral, de que já na próxima semana o seu titular apresentará as primeiras denúncias contra os políticos-vampiros. Já o presidente do Senado declarou que, "com a maior responsabilidade e isenção", o procurador manterá o Congresso a par do andamento do seu trabalho, "para que possamos separar o joio do trigo". É aí que mora o perigo. Não está claro, para dizer o mínimo, que suas excelências, ressalvadas as costumeiras exceções, saibam, ou queiram, distinguir uma coisa da outra. O senador Renan Calheiros também falou em "punir exemplarmente os culpados".
A julgar pelo longo e lastimável retrospecto na matéria, cada vez que se ouve um político apelar para esse desacreditado lugar-comum, o primeiro impulso é levar as mãos à cabeça. O segundo é calar a pergunta que se impõe, por medo da resposta: "Até quando?"

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